Pastor diz que o sangue e as feridas dos LGBT estão nas mãos dos crentes

John Pavlovitz, que recentemente prometeu amar seus filhos caso eles se revelem gays, diz que legado dos cristãos em relação à comunidade LGBT não é de amor

por James Cimino

No mês passado eu publiquei aqui um texto do pastor americano John Pavlovitz. O texto em geral foi muito bem recebido, por cristãos inclusive, mas houve alguns comentários de pessoas de alma obscura acusando o pastor de ser um “falso pastor”, que “distorce” a palavra de Deus.

Relendo seu blog, descobri que o próprio John Pavlovitz recebeu esse tipo de comentário e fez um texto sobre “distorção”. Chama-se “Amor Distorcido” e fala sobre o que ele acha de cristãos que propagam ódio a crianças e adolescentes homossexuais.

As palavras do pastor John me trouxeram alívio e me lembraram de toda a culpa que eu carregava quando na adolescência percebi minha inclinação a gostar de meninos. Batizado como presbiteriano, fui ensinado que meus sentimentos eram uma aberração que me condenariam ao inferno. Mas me lembro de um dia ter chegado à seguinte conclusão: ora, se Deus fez as pessoas todas, eu inclusive, e como tenho certeza de que não escolhi ser assim, provavelmente Deus me ama como eu sou, afinal, Deus é amor e fez todas as criaturas a sua imagem e semelhança. Ouvir isso de mim me libertou, mas ouvir o mesmo de um pastor me deu aquilo que toda igreja deveria dar: acolhimento. Leiam o texto do pastor John abaixo.

Amor nem sempre se parece com amor. Quando eu publiquei em meu blog, há algumas semanas, um texto prometendo amar meus filhos se eles fossem gays, eu estava completamente preparado tanto para apoio quanto para hostilidade.

Eu só não estava preparado de maneira alguma para as milhares de pessoas que chegaram a mim pessoalmente para me agradecer por ter trazido alguma cura e esperança a suas famílias.

Pais, filhos, irmãos e adultos têm confiado em mim, contando da dor e do assédio moral sofrido, além da rejeição que eles receberam de igrejas, pastores e de membros da igreja. De seguidores de Jesus.

Dezenas de pessoas de todo o mundo têm compartilhado comigo as suas histórias devastadoras sobre exclusão e isolamento, de orações não respondidas para mudar, de terapias destrutivas para a conversão, de repetidas tentativas de suicídio e de serem ativa e passivamente afastados da fé, por pessoas de fé.

Esta é a realidade da teologia da igreja em relação à homossexualidade.

Este é o custo de nossa religião para a com a comunidade LGBT. Mais precisamente, é o custo de nossa religião para seres humanos LGBT. Este é o dano colateral doloroso que vem quando vemos os princípios e ignoramos as pessoas; quando nos recusamos a dar-lhes a dignidade que merecem.

Aparentemente amor faz mal. Muito, muito mal.

A defesa mais comum que eu ouvi nos últimos 14 dias vinda de cristãos que acreditam que ser gay é tanto escolha quanto pecado, geralmente é dita como bem intencionada: “Bem, nós estamos apenas amando as pessoas ao sermos honestos com elas, dando-lhes ‘a verdade'”. Então, dizer às pessoas a verdade é amar.

Sério? A verdade? Tem certeza de que você quer a verdade? (Eu só quero citar Jack Nicholson agora)

A caixa postal do meu e-mail está quase explodindo com verdades, se você estiver interessado em lê-las, cara Igreja.

Ela está cheia de ofensas das mais vis, do mais profundo desprezo, de piadas grosseiras, de violência física, e de terror. Está lotada com xingamentos nos corredores das escolas, e espancamentos nas ruas das cidades, de expulsões de igrejas, de humilhações no local de trabalho, de automutilações brutais, e todo tipo de terrorismo pessoal e perpétuo.

E nada disso parece amor pra mim.

Isso certamente não parece amor para a doce garotinha de 12 anos que, em sua igreja, tem sido repetidamente atingida por comentários de que ela é uma abominação; de que Deus já a despreza.

Não parece amor para os pais devastados que assistiram seu filho se enforcar porque seus colegas cristãos disseram que era melhor ele estar morto do que ser gay.

Não parece amor quando a dedicada professora cristã perde a carreira da sua vida por nenhuma outra razão além do seu  status de relacionamento.

Não parece amor quando um homem cristão de 60 anos ora toda a sua vida pedindo para ser “consertado” e, ainda assim, é tratado como um pária na sua família de fé.

Não se parece com amor o casal gay que teve a cabeça esmagada por desconhecidos que se dizem “cristãos” enquanto caminhavam pela rua.

Não se parece com o amor o fato de a família de um estudante transexual não conseguir encontrar uma igreja familiar que os receba, inclua ou reconheça.

Eu estou totalmente convicto que não se parece com amor para Jesus.

O verdadeiro problema de tanta teologia cristã para com a comunidade LGBT é que, aparentemente, funciona bem para alguém que despeja partes da escritura ou frases religiosas. Mas muitas vezes tudo isso se desfaz quando tentam traduzir essas escrituras para as vidas das pessoas de hoje em dia, com relacionamentos em que o afeto realmente importa.

Quando você tem a coragem, a decência e a compaixão para sair de trás dos teclados de computador e das telas de plasma; de telefonemas, programa de rádio ou gritando em megafones, você acaba cara a cara com belas pessoas, feridas, com cicatrizes e com histórias reais, daí você percebe que há algo de errado.

Há algo bem desfeito.

Isto não é com o que o amor de Cristo se parece.

O amor de Jesus, mesmo que viesse com palavras duras, de alguma forma, sempre me pareceu como amor. Pessoas eram compreendidas. Eram ouvidas. Se sentiam  tocadas. Terminavam com mais dignidade do que quando começaram. Eu não tenho certeza que a comunidade LGBT podem dizer o mesmo sobre seus encontros com a maioria dos cristãos. Será que você os tem tocado assim?

Assim, muitos crentes querem apenas tratar do pecado. Sobre a teologia a respeito da homossexualidade que eles alegam estar defendendo homossexualidade, quando na verdade não é nada disso.

Independentemente de onde você se posiciona teologicamente como cristão, isto é sobre o tratamento de todas as pessoas, de como elas são feitas por Deus e à sua imagem.

Jesus pregou que amemos a Deus e ao próximo como amamos a nós mesmos. Na verdade, essa é a maior expressão da sua palavra, nossa principal responsabilidade moral e pessoal. Você quer discutir isso? Discuta com Jesus.

Quero dizer à Igreja que o sangue e as feridas da comunidade LGBT estão em suas mãos e nas minhas, como crentes, enquanto nós permitimos que qualquer cristão desumanize-os em nome de Deus.

No entanto, queremos justificar essa barbárie, quando o resultado líquido de nossa religião para muitos homossexuais é que famílias inteiras estão sendo dilaceradas, enviadas para as sombras, horrivelmente maltratadas em nome de Jesus.

Pessoas reais, de carne e osso, são convidadas a viver um inferno individual a cada dia nas mãos de pessoas que exaltam Cristo. O tratamento da Igreja para com as pessoas da comunidade LGBT tem sido cheia de pecado e está matando o nosso testemunho para o mundo.

Estamos tornando praticamente impossível para os homossexuais permanecerem em nossas igrejas. Então nos sentimos justificados em condená-los a andar longe de Deus. A verdade é que muitas vezes eles não estão se afastando de Deus, eles estão apenas se afastando do caminho que os ferem.

Estamos perdendo credibilidade, não porque estamos “fazendo apologia ao pecado”, mas porque quando nos encontramos com a realidade, não sabemos como “amar o pecador” de qualquer forma que se assemelhe remotamente ao que Jesus fazia. E nosso “Deus é amor” se torna uma platitude vazia.

Digo à Igreja: este é o legado que estamos construindo nestes dias para a comunidade LGBT e aqueles que os amam. E eu lhes asseguro que não é um legado de amor.

Eu não sei qual é a resposta para você, e eu não posso dizer-lhe como sua teologia se expressa nas vidas das pessoas de verdade. Eu só sei que nós, como Igreja de Cristo, podemos fazer melhor, independentemente da nossa posição teológica. Temos que fazer melhor.

Aqui é onde nossa fé é testada como palavra de Cristo ou não.

Este é o ponto onde a palavra de Deus, a qual gostamos tanto de pregar, se mostra deformada.

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2 comentários

rana

como vive dizendo um grande amigo ”não há que dizer só sentir..”. Se mais pessoas enxergassem essas verdades que o pastor disse o mundo seria melhor, não só em relação a comunidade LGBT, ms em relação ao mundo. Confesso que tenho minhas propias crenças sobre que é Deus, mas esse depoimento mostra que a religião não precisa ser intolerante e manipuladora.. as pessoas que á tornam assim, e divulgam a imagem de um Deus mesquinho. Pessoas assim criam a uma intolerância infundada, e gera mais intolerância em retorno.

Jamisson

Fiquei completamente emocionado com esse depoimento.. É justamente isso que vem ocorrendo nos dias de hoje – pessoas que dizem amar mas acabam entrando em controvérsia quando se depara com a realidade – infelizmente.

Sou filho de um fundamentalista, cresci na igreja e senti de perto o sofrimento de ter que renunciar minha condição, por que aquela doutrina não me aceitava.

É triste olhar para trás e perceber o quanto tempo eu perdi, mascarando uma pessoa que não era eu. Ah, se todos tivessem a visão desse homem.. Pelo contrário, preferem usar seus discursos de morte, levando muitos homossexuais ao ponto de suicidar-se por se sentirem já condenados – como ocorreu com um amigo meu e muitos outros – que esse pastor sirva de exemplo pra muitos que estão sendo levados por doutrinas erróneas.

Que esses revejam seus conceitos sobre o que realmente é amor e que aprendam a se colocar no lugar dos outros, por que condenar é fácil pra quem não tem o mínimo de sensibilidade do que é ser um homossexual.

Enfim, mais amor e direitos iguais parar todos!

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