A pergunta, enviada por um ouvinte, era simples: “por que os gays são tão ricos e bem-sucedidos?”. Afinal, bairros com grande população gay costumam ser mais bem cuidados e os gays, mais bem vestidos. Com a maneira inovadora de atacar esse tipo de questão que tornou o jornalista Stephen Dubner e o economista Steven Levitt famosos em seu livro Freakonomics, os autores destrincharam essa pergunta e suas premissas em seu podcast, e chegaram a uma conclusão: pouco se sabe de verdade sobre o poder aquisitivo dos gays, mas o pouco que se sabe conta uma história bem diferente.
As razões por que se assume que os gays são tão endinheirados já são bem conhecidas:
- De acordo com informações do censo dos Estados Unidos, a renda familiar média de casais heterossexuais é de 86 mil dólares por ano, enquanto a de casais gays é de 105,6 mil dólares por ano (No Brasil, a proporção de casais gays na faixa de maior poder aquisitivo também é maior que a proporção de casais héteros, segundo o último senso do IBGE).
- Os gays tendem a ter um grau de formação maior que os héteros, até como uma maneira de proteger seu futuro contra os possíveis preconceitos de que poderão ser vítimas (segundo a Unesco, cada ano extra de educação aumenta os rendimentos do indivíduo em 10%).
- Homens (injustamente) costumam ganhar mais que mulheres, então um lar com dois homens teria automaticamente maior rendimento.
- E por fim, há a famosa sigla DINK – Dual Income, No Kids, ou seja, renda dupla sem crianças. Como os gays não costumam ter filhos para sustentar, eles podem dispor desse dinheiro em seu próprio conforto.
Acontece que essas informações não necessariamente refletem a realidade. Pesquisas que tentam desvendar a vida dos homossexuais sempre batem num grande obstáculo: o objeto pesquisado mente. Pesquisas de censo, tanto nos EUA como no Brasil, dependem da autodeclaração dos casais – ou seja, Pedro e João têm que fazer questão de contar pra mocinha do senso que são um casal sim. Caso contrário, suas escovas de dentes no mesmo copo, seu lar com três cachorros e seu relacionamento de décadas continuarão desconhecidos pelo IBGE. Outra distorção que pode ser causada por esse tipo de pesquisa é que casais gays mais bem sucedidos tendem a querer divulgar mais seu sucesso, o que pode fazer que uma proporção maior de gays ricos exibam-se para as estatísticas.
Outra falha do sistema é exatamente essa preocupação sobre a vida de casais. Existe muito pouca informação sobre a vida e a renda dos gays solteiros – para os censos, solteiros são todos igualmente solteiros, independente da atração sexual. As bichas descompromissadas podem não estar tão bem na conta bancária assim.
As poucas pesquisas confiáveis sobre o tema, realizadas pelo Instituto Williams da Universidade da Califórnia em Los Angeles, apontam um quadro bem diferente: homens gays e bissexuais em média ganham 10 a 32% menos que homens heterossexuais com as mesmas qualificações (mulheres lésbicas na verdade ganham mais que as mulheres heterossexuais, provavelmente porque podem se dedicar à carreira e à formação de uma maneira que mulheres heterossexuais com filhos não conseguem). Os pesquisadores suspeitam que há duas razões para isso:
- Discriminação pura e simples: os empregadores percebem nos currículos a orientação sexual dos candidatos e passam outros, de heterossexuais, na frente. De fato, não é tão difícil assim descobrir se alguém é gay pelo currículo. Se ele for solteiro em idade “avançada”, já é um indício. As experiência profissionais anteriores podem também dar pistas. E, na falta disso tudo, uma varredura nas redes sociais também funciona. Andras Tilcsik, sociólogo de Harvard, chegou à conclusão de que currículos que deixam explícito que o candidato é gay têm 40% menos chance de conseguir uma entrevista de emprego que os de héteros. Uma entrevista. Imagina o emprego em si.
- Tipo de emprego: homens gays também muitas vezes têm tipos de trabalho que são historicamente pior remunerados: enfermeiros, cabeleireiros, professores etc.
A conclusão a que chegam Levitt e Dubner: esse é mais um caso em que ideias preconcebidas distorcem a visão da realidade, como acontece tantas vezes, especialmente com os homossexuais. A história dos gays se espalha talvez por necessidade de se validar um nicho econômico, talvez numa tentativa de atrair mais respeito para uma fatia da sociedade historicamente desprezada, talvez por inveja dos heterossexuais que se revoltam ao ver gays farreando em cruzeiros enquanto eles têm que ralar para pagar a escola das crianças. Mas a realidade é outra.
Eu sou gay e justamente por isso sou muito rico, minha renda está lá na ponta do histograma, nos 1% mais ricos da minha cidade. E só fiquei rico porque me discriminaram muito, sendo obrigado a criar um verdadeiro pandemônio patrimonial e intelectual pra me garantir.
Na cidade aonde moro, Campinas – SP, a cada 100 gays, 85 sao pobres. Dos 85, pelo menos 40 sao beeeeeem pobres.
[…] suposta inclusão também mascara a invisibilidade dos homossexuais no telemarketing. Estudos também comprovam que os LGBTs ganham menos que heterossexuais e tem menores oportunidades de […]
Um estudo dizendo que ganham menos contra dezenas dizendo que ganham mais. Nada além de preconceito do autor.
Acho que o pessoal já destruiu os argumentos do autor do texto…”Gays mentem”, como se mentira fosse exclusividade de homossexuais. Entre o censo e a sua opinião baseada no preconceito, em qual deveríamos depositar fé? Acho que não há dúvidas…
Novamente, mentira não é exclusividade dos homossexuais. Todos podem mentir para o senso. Mas quanto à orientação sexual, é muito mais provável que um gay minta para a pessoa do censo que um hétero. Além disso, de novo, a amostragem que o censo aponta é muito pequena e de forma nenhuma pode ser considerada representativa. O censo de 2010 aponta 60 mil casais homoafetivos no Brasil inteiro, como já apontei num link de outro comentário. Agora pensemos: só a Parada Gay de São Paulo todos os anos se orgulha de trazer às ruas mais de um milhão de pessoas. 60 mil casais é 1,2% de um milhão de pessoas. Nenhum resultado que venha de 1,2% de uma população pode ser considerado representativo.
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Gays mentem e héteros não? Acho que o seu raciocínio está errado. Você acha que muitos falam que são héteros porque tem medo de se assumir gays. Até aí tudo certo. Mas quando um casal se assume gay, eles podem mentir tanto quanto um casal hétero sobre a renda.
Mas Márcio, achar que os gays pobres fazem assim, os gays ricos fazem assado e desse achismo questionar um levantamento sério como o Censo… Sabe! Falar de pesquisas é qualificar o debate. E aí, não dá pra lidar com nossos preconceitos ou achismos! Já vi falar que “pesquisa com gay não vale pq gay mente”. Nossa, então quer dizer que ser hétero é ser verdadeiro??? Sabe! Nem dou trela!
Vou mandar sim as pesquisas. E outras também. Tarefa para o recesso, que não vou ter. rs
Não é tanto achismo, Welton. O censo de 2010 (linkado na matéria, mas também vai o link aqui), aponta que existe cerca de 60 mil lares comandados por casais homoafetivos (e é o primeiro a contabilizar essa informação). A população do Brasil é, segundo o censo, de 190,7 milhões de pessoas. Quando se tenta avaliar o porcentual da população que é gay, os números variam entre 3% e 10% – seja como for, uma porcentagem muito maior do que o número apontado na matéria e no resultado de 2010. Ou seja, tem muita gente escondendo do Censo que é gay. Não estou colocando em dúvida a seriedade do Censo, mas esse é um problema inerente à coleta de informações sobre os homossexuais.
Creio que o que foi comentado como “gay mente”, é pelo fato que realmente muitas pessoas mentem em pesquisas se forem perguntadas sobre sua orientação sexual, nesse quesito heterossexuais não mentem mesmo, afinal por que teriam de mentir, mas o contrario é muito comum. Muitos homossexuais mentem em pesquisas sobre sua orientação, seja por não se aceitarem ou por medo e apreensão. Nesse ponto, pessoas que vivem em ambientes de maior renda e maior nível de instrução, que tendem a serem menos preconceituosos, tem menos problemas em informar sua real orientação. Eu mesmo já conheci casais gays que não comentam em pesquisar serem um casal, infelizmente.
Nesses questionamentos, sempre bem-vindos, claro, há de se pensar: o que faria um segmento populacional que, majoritariamente, não tem filhos ser mais pobre do que um que tem filhos (dois, três, quatro)? Claro que não proponho aqui um “olhe sua vizinhança e descubra o mundo”. Não!. Mas não beira a lógica imaginar que sim, gays conseguem ter gastos maiores em setores como lazer, moradia, cuidados pessoais e educação quando você compara a ida de um casal gay a um restaurante almoçar no domingo e um casal hétero e seus dois filhos? Quantas vezes, com o mesmo dinheiro, um casal gay poderia se dar ao luxo de almoçar no restaurante (e aí somando duas rendas superiores na sociedade – homens) em relação à família hétero (em que, ainda, pode-se supor que o homem hétero é que bancou o almoço para todos os convivas)? Um indicativo, nessa postura de questionar pesquisa como o Censo, pode ser tirado daí, certo? Até porque muitos levantamentos sobre renda levam em consideração a renda per capta (por cabeça).
E aí, falemos de algo mais grave ainda. Cerca de 30% das famílias brasileiras são chefiadas por mulheres. E mais: elas são solteiras e com filhos! O que faria um gay de 35 anos com o mesmo nível de instrução e cargo e sem filho ter menos renda do que uma mulher (que, infelizmente, recebe menos em geral) que tem de sustentar pelo menos um rebento?
Sobre filhos, perguntem às mulheres quantos planos de pós-graduação, investimento em educação, cursos etc elas acabaram tendo de deixar de fazer ou para cuidar dos filhos o para sustentá-los! Isso está longe de ser um cisco na realidade social das mulheres. E gays, façam a mesma pergunta a eles! Proponho esse exercício justamente para destravar a correta relação entre chance de avanço educacional-maior nível de instrução formal-renda.
Sobre ainda pesquisas em que tanto lésbicas como gays são tidos conjuntamente, sempre procuro saber nelas o que cada um desses subsegmentos têm de dados. Sim, porque onde já vi o gênero ser um item de separação de dados e cruzamentos, os dados sobre renda e anos de estudo dos gays ficam ainda maiores! E isso devido à questão que ainda merece ser combatida da baixa remuneração das mulheres, mesmos quando atuam em cargos ocupados por homens.
Sobre o argumento de que casais gays – minha Madonna, rogai por nós – “tendem a querer divulgar mais seu sucesso”, olhe, não vou me rebaixar a tanto. Tentar contestar essa proposição seria isso: contra-argumentar algo desse quilate seria dar um tipo de validade a ele. E legitimidade é algo que esse tipo de idéia não merece! Imaginei agora o casal gay confabulando: “olhe, gatuxo, a pesquisadora do Censo vem aqui. Vamos arrasar com a cara da racha e dizer que somos riquíssimas, tá? Prepare a sidra! Vamos tombar com o IBGE. Flopar essa pesquisazinha! Tá boa?!”
Criticar institutos como o IBGE, como a Word Travel Association e quase a totalidade das pesquisa sobre gays e renda que já vi na vida e já coordenei (mais de 10) – e aí até um pouco de lógica, como propus acima -, bom, direito de todos e dever de quem quer conhecer a realidade. Eu mesmo questionei, questiono e questionarei sempre, mas se o amálgama argumentativo não for de qualidade pode parecer – e aí, cuidado – que blogueiros com necessidade de postar algo tendem a criar polêmicas para ter o que publicar, aponta estudo!
Oi Welton! A gente não tenta criar polêmica para ter o que publicar – eu, no meio de tudo o que eu leio diariamente para me manter informado e encontrar conteúdo interessante para esse blog, encontrei esse artigo que foge do senso comum e resolvi compartilhá-lo nesse blog. Acho sim que ele desenha algo mais interessante do que o que estamos acostumados a ouvir, por apontar os problemas nos recortes das pesquisas descritos no texto. É importante apontar, por exemplo, que gays podem estar sendo descriminados na seleção de emprego e isso pode estar afetando sua renda, apesar da educação.
Eu não acho que gays ricos resolvam “flopar a pesquisa”, mas acredito que casais gays mais humildes possam sim tender a esconder da pesquisadora do censo que são gays – por vergonha, por falta de cultura, por viverem num meio mais intolerante. Acho legal que você tenha feito mais de dez pesquisas sobre gays e renda, por favor me envie os links para que eu possa me informar melhor e de repente preparar um post de follow-up! Obrigado!
Honestamente, o percentual que responde ao Censo do IBGE é tão ínfimo que nem deveria ser relatado. O que podemos apontar é: nas grandes cidades do país, casais gays (elevado padrão educacional) aparentam ter mais dinheiro que casais hétero em situações equivalentes (ou seja a categoria que correspondem as famílias que ocupam as profissões de maior remuneração). No outro extremo, temos a maior parte da população brasileira: os peões e sub empregados: profissões que utilizam baseadas no uso da força física para garantir melhores condições de empregabilidade, tradicionalmente, os gays que pertencem a essa classe social desempenham funções historicamente femininas, que consequentemente ganham menos. Neste ponto analisamos só os homossexuais masculinos. Pois caso também fossemos analisar os casais de mulheres, a situação seria muito pior na condição de casal de lésbicas pobres, pois estas só não ganhariam menos que as mulheres pobres solteiras (com ou sem filho)