Quando o assunto é trabalho, há muita controvérsia sobre se a melhor opção para os LGBT é se assumir ou ficar no armário. Particularmente eu sempre achei mais produtivo e sempre obtive mais respeito por ser assumido, mesmo em ambientes teoricamente inóspitos para gays como escritório de engenharia e canteiros de obras, onde trabalhei como projetista e mestre de obras antes de me tornar jornalista.
O texto abaixo, traduzido do blog Shumpeter, da revista Economist, traz o relato do livro escrito por John Browne, um dirigente gay de uma das maiores companhias petrolíferas do mundo, a BP, que após ter sua sexualidade exposta em um tabloide, teve de renunciar ao cargo e, mesmo assim, se reergueu criando outra companhia, desta vez de extração de gás natural.
Embora o blog mostre um olhar positivo sobre o ponto de vista de Browne, ao final eles faz algumas considerações sobre os efeitos considerados pelo mercado como negativos para a globalização, como o problema de ter de enviar gays para negociar em países altamente homofóbicos. Outro ponto interessante citado no artigo são os chamados “consultores de diversidade”, que a meu entender são ativistas dos direitos LGBT que monitoram as empresas e que, segundo o blog, estão sempre redefinindo os conceitos de discriminação de forma a manter os LGBTs em seus empregos, a despeito de terem ou não competência para os cargos que ocupam.
O título do original é “The Corporate Closet”, e convoca as empresas a serem mais “gay friendly”.
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Em 1º de maio 2007, John Browne renunciou ao cargo de chefe da BP (sigla para British Petroleum que, após uma reformulação da marca, virou Beyond Petroleum), um gigante petrolífera britânica, com sua carreira aparentemente em ruínas. Um tabloide expusera seu caso com um ex-garoto de programa. Nas semanas que se sucederam, lorde Browne foi submetido a um daqueles julgamentos midiáticos que os britânicos adoram. Três anos depois do desastre da Deepwater Horizon, uma explosão que levou ao vazamento de milhões de litros de petróleo ao longo da costa americana banhada pelo golfo do México, sugeriu-se que havia razões mais graves do que suas preferências sexuais privadas para questionar seu mandato na BP. O desastre parecia confirmar tanto as preocupações de que alguns analistas tinham sacrificado investimento em uma corrida para o crescimento, como as acusações dos ambientalistas de que seu reposicionamento da marca era apenas “greenwashing” superficial.
N. do T.: O termo “greenwashing” é um neologismo que indica a injustificada apropriação de virtudes ambientalistas por parte de organizações (empresas, governos, etc.) ou pessoas, mediante o uso de técnicas de marketing e relações públicas. Tal prática tem como objetivo criar uma imagem positiva diante opinião pública acerca do grau de responsabilidade ambiental dessas organizações ou pessoas (bem como de suas atividades e seus produtos), ocultando ou desviando a atenção de impactos ambientais negativos por elas gerados.
Apesar de todos os golpes a sua reputação, Lord Browne tem feito um trabalho notável de reviver sua carreira. Ele construiu a Riverstone Holdings, uma empresa de “private equity” que investe em extração de gás natural na Europa. Ele também se transformou em um dos principais porta-vozes dos direitos dos homossexuais no mundo corporativo. Seu novo livro, “The Glass Closet” (O Armário de Vidro), é sua declaração mais abrangente sobre sua posição: parte dele tratar de memórias de como era viver uma mentira durante a condução de uma das maiores empresas do mundo e a outra parte é um manifesto corporativo sobre por que “sair do armário é um bom negócio “.
Em face disso, o mundo corporativo adotou os direitos dos homossexuais com entusiasmo. Mais de 90% das empresas do ranking Fortune 500 têm políticas para prevenir a discriminação e a homofobia. Lloyd Blankfein, o chefe do Goldman Sachs, e Jamie Dimon, o chefe do JPMorgan Chase, se manifestaram a favor do casamento homossexual. Redes in-house para gays, como Glam (Gays e Lésbicas da McKinsey) e Gayglers do Google, se tornaram parte do mobiliário corporativo. Lord Browne diz que ele mesmo já ouviu falar de estudantes de negócios que fingem serem gays a fim de aumentar suas chances de empregos em empresas de elite.
Um olhar para além desses sinais de boas-vindas, no entanto, mostra que o panorama dos gays no mundo corporativo ainda não é muito bom. Nem a Fortune 500 nem o FTSE 100 (as cem empresas mais representativas na bolsa de Londres) têm um único CEO abertamente gay. Christopher Bailey será o primeiro homossexual assumido a figurar no FTSE quando ele tomar posse como chefe da Burberry ainda este ano. Estima-se que 41% dos funcionários homossexuais nos Estados Unidos e 34% na Grã-Bretanha permanecem no armário, segundo o livro.
Lord Browne afirma que os altos escalões do mundo corporativo são obrigados a serem lentos na adaptação às mudanças de costumes. Mas ele também observa que muitos funcionários mais jovens ainda estão escolhendo permanecer no armário. Eles temem que estar “fora” irá levá-los a serem rotulados como adequado para alguns trabalhos, mas não para outros. Ou ainda prejudicar suas chances em um mercado de trabalho altamente competitivo. E eles preferem manter suas vidas particulares para si mesmos.
O último ponto é certamente compreensível: o trabalho é um lugar onde as pessoas vão para ganhar a vida, em vez de descobrir suas almas. Mas Browne tem objeções poderosas para este posicionamento. A barreira entre “trabalho” e “vida” é fina, particularmente no atual ambiente de trabalho de alta pressão. As empresas estão constantemente convidando parceiros das pessoas para funções sociais. Acima de um determinado nível de empresários sênior, há poucas chances de não se operar no centro das atenções. Os que disfarçam sua identidade sexual para chegar ao topo, correm o risco de ter o mesmo destino de Browne.
Lord Browne é bem convincente ao dizer que sair do armário é bom para os negócios. Abraçar direitos dos homossexuais ajuda as empresas a vencer a guerra por talentos com alto nível de instrução, não apenas porque elas têm mais chances de recrutamento de funcionários homossexuais (que são, talvez, entre 5% e 10% da força de trabalho), mas também porque as companhias dão um sinal positivo para heterossexuais simpatizantes da causa .
Sair do armário provavelmente melhora a produtividade dos funcionários gays: ele cita uma série de estatísticas, juntamente com a sua própria biografia, para mostrar que as pessoas ficam mais criativas se eles não estão usando um quarto de seus cérebros para esconder quem são. Ele é ainda mais convincente ao argumentar que uma combinação de lógica de negócios e mudança de atitudes sociais irá reduzir radicalmente o número de funcionários de empresas que se sentem obrigados a se esconder no armário.
Armadilhas do orgulho
A defesa entusiástica do senhor Browne leva-o a passar por cima de algumas das questões difíceis levantadas pelo movimento LGBT em relação a locais de trabalho mais “gay friendly”. Ele nunca tem uma má palavra no que diz respeito aos “consultores de diversidade” que lhe fornecem a maior parte de estatísticas do livro. Ele parece ter se esquecido de que estes consultores são membros de uma indústria que redefine constantemente o que se entende como discriminação, de modo a manter homossexuais com problemas de produtividade e competência no trabalho.
Em particular, ele deve ter mais a dizer sobre a forma como os direitos dos homossexuais vai complicar a globalização. O mundo está se dividindo em dois campos nitidamente opostos: um ocidental, cada vez mais “gay friendly” e outro formado pelos 77 países que ainda proíbem atos homossexuais consentidos entre adultos. Uganda, Nigéria e Rússia, por exemplo, têm fortalecido suas leis homofóbicas em reação à liberação gay no ocidente.
Lord Browne elogia empresas como a IBM, que se orgulha em perseguir as mesmas políticas de combate à discriminação em todos os 170 países em que opera. Mas, na prática, muitas multinacionais e seus funcionários homossexuais terão de fazer escolhas difíceis.
A própria indústria do Sr. Browne, terá dificuldades para enviar pessoal abertamente gay a muitos dos maiores países do mundo produtores de petróleo, talvez limitando suas perspectivas de carreira. Nos países ricos, a velha cultura do “não pergunte, não diga” está rapidamente chegando ao fim, graças em parte a histórias como de lorde Browne. A nova cultura, embora mais admirável do que a antiga, vai ter de confrontar as empresas com alguns testes gerenciais complicados.
Quem mandou se assumir!
Por isso que eu fico no armário mesmo…
Sociedade hipócrita merece mais hipocrisia….
Ainda bem que se levantou, mas é um caso em muitos outros mal resolvido.
[…] Durante um painel sobre o livro The Glass Closet, sobre o armário do mundo corporativo (leia nosso post sobre o livro), o jornalista Jim Stewart comentava sobre as dificuldades que encontrou para conseguir aspas de […]
Eu não sei de onde o lado Bi tira algumas ideias péssimas. Outra dia fizeram uma matéria criminosa dizendo que gays não deveriam fazer profilaxia. Agora eles escrevem a seguinte sentença sem nenhum fundamento “Ele parece ter se esquecido de que estes consultores são membros de uma indústria que redefine constantemente o que se entende como discriminação, de modo a manter homossexuais com problemas de produtividade e competência no trabalho.” De onde James Cimino tirou uma coisa dessas? Qual é a fonte de uma afirmação tão irresponsável? Não é isso que consultores de diversidade fazem, tão pouco existe um “industria”. Muito pelo contrário. É graças a essas poucas pessoas com a coragem de levar esse tema dentro das empresas que faz com que LGBT possam se assumir. esse site tem o mesmo problema do Mix Brasil, é um site forjado na baixa autoestima. Precisa achar alguma coisa negativa para manter os homossexuais sempre na retranca, no medo e na vergonha. Essa linha “ta vendo como na verdade a vida para os gays é ruim” é um reflexo nefasto de um jornalismo LGBT desencontrado, feito por um bando de gays com complexo de vira latas que não sabem fortalecer a própria comunidade em que estão inseridos.
Eu sei de onde tirei essa informação, da tradução do texto da “Economist”. Não fui eu quem disse isso. Mas você, como comentarista de internet, também não decepciona. Faz um monte de críticas sem nem ler o texto. Quem está dizendo isso é o autor do texto de uma revista obviamente escrita para o mundo corporativo e para as instituições de capital financeiro. A citação que fiz no começo é a seguinte: “Outro ponto interessante citado no artigo são os chamados “consultores de diversidade”, que a meu entender são ativistas dos direitos LGBT que monitoram as empresas e que, SEGUNDO O BLOG, estão sempre redefinindo os conceitos de discriminação de forma a manter os LGBTs em seus empregos, a despeito de terem ou não competência para os cargos que ocupam.” Já a citação do artigo da “Economist” é o seguinte: “Ele nunca tem uma má palavra no que diz respeito aos “consultores de diversidade” que lhe fornecem a maior parte de estatísticas do livro. Ele parece ter se esquecido de que estes consultores são membros de uma indústria que redefine constantemente o que se entende como discriminação, de modo a manter homossexuais com problemas de produtividade e competência no trabalho.” Esse blog não é forjado na baixa autoestima de ninguém, ele é apenas feito para pessoas que sabem ler e que têm paciência de ler um texto até o final. Quanto à matéria sobre a PrEP ser “criminosa”, eu até concordaria contigo se fosse realmente disso que ela tratasse. Mas o que ela diz é que deixar de usar camisinha para apenas tomar a PrEP é uma ideia cretina. Talvez não tão cretina como a gente pensava, mas isso será tratado com maior profundidade em nosso próximo programa. Se você tiver paciência para ouvir também, claro. Porque, se você não tiver, eu sugiro que você pare de ler o Lado Bi, como eu faço com a Veja e seus colunistas.
BP é British Petroleum.
Oi Rick, o nome original era British Petroleum, mas depois do rebranding virou Beyond Petroleum. Mas talvez isso não tenha ficado claro no texto. Vou arrumar.