Ativistas LGBT fazem campanha de boicote contra “Stonewall”, o filme

O longa de Roland Emmerich sobre a revolta que deu início ao movimento LGBT atual é acusado de excluir negros e latinos da história

por Marcio Caparica

O filme Stonewall, de Roland Emmerich, que estreia dia 25 de setembro nos Estados Unidos, tornou-se alvo de uma campanha de boicote. O longa  pretende contar a história da revolta que aconteceu em Nova York em 1969, e é vista como um dos principais pontos de partida do movimento pelos direitos civis igualitários. Segundo o site Hollywood Reporter, ativistas LGBT norte-americanos acusam o diretor de deixar de escanteio importantes figuras históricas negras, latinas e trans, para centralizar a narrativa num personagem fictício, gay, cis e branco.

O trailer do filme, lançado recentemente, mostra um jovem chamado Danny (Jeremy Irvine) que, depois de ser expulso de sua casa no interior dos EUA, vai para Nova York e acaba liderando o confronto contra os policiais na porta do pub Stonewall, seguido por outros homens em sua massacrante maioria brancos e cis.  Pelo que se vê dessa prévia, há uma drag queen latina (que vai levar um pé na bunda do herói) e um gay negro. Os fatos históricos pintam um retrato bem diferente: o Stonewall Inn era um ponto de encontro popular para clientes de todas as etnias, orientações sexuais e identidades de gênero – entre elas pessoas negras e transgênero como Sylvia Rivera e Marsha P Johnson, que se tornaram figuras importantes do ativismo LGBT depois da revolta.

Uma petição online pedindo o boicote de Stonewall já conta com quase 22 mil assinaturas. Outra, reclamando do teor revisionista do filme, acumulou quase 500. “Hollywood tem uma longa história de higienização e construção de narrativas com Salvadores Brancos, mas isso já é demais”, explica a petição. “Um filme historicamente correto sobre as revoltas de Stonewall se concentraria nas histórias de pessoas não-caucasianas queer e fora da conformidade de gênero como Sylvia Rivera e Marsha P johnson. Não as relegue a figuras de fundo a serviço de um protagonista fictício branco, cis e homem.”

Figuras históricas importantes ficaram de fora do roteiro de Stonewall, denunciou o site Gaily Grind: Stormé DeLarverie, a lésbica caminhoneira que deu o primeiro soco nos policiais, desencadeando o confronto, não consta na lista de personagens do filme. Tampouco aparece nessa lista a ativista bissexual Brenda Howard, que organizou a primeira Parada do Orgulho LGBT, um ano após o embate em frente ao inn.

Jon Robin Baitz, co-roteirista do filme, escreveu em sua página no Facebook que a campanha de marketing do filme não representa a mistura étnica que o longa apresentará. “Eu entendo as pessoas que estão revoltadas por causa de um filme que ainda não viram, e peço que abram seus corações e permitam que o filme seja julgado com base em seus próprios méritos, não pelas exigências de um departamento de marketing, porque o marketing se apoia completamente no medo, enquanto a arte se apoia na ira, na esperança e no fogo. O cinema americano fica num meio-termo – oscilando nervosamente entre o comércio e algo maior, e tropeçando o tempo todo.”

Emmerich também foi ao Facebook defender sua obra: “eu compreendo que, depois do trailer ter sido lançado, haja preocupações sobre como é retratado o envolvimento de Danny, mas quando esse filme – que é um verdadeiro trabalho de amor para mim – finalmente chegar aos cinemas, o público verá que ele honra profundamente os ativistas que estavam lá na vida real.”

O elenco e equipe de filmagem de Stonewall

O elenco e equipe de filmagem de Stonewall

Em artigo para o site Gay Star News intitulado “I was at the Stonewall riots and it didn’t look like the movie” (“Eu estava na revolta de Stonewall e não foi como mostra o filme”, em tradução livre), a reverenda Irene Monroe aponta: “Na primeira noite da revolta do Stonewall Inn, afrodescendentes e latinos eram a maioria dos manifestantes porque nós frequentávamos o bar em massa. Para jovens sem-teto negros e latinos, que dormiam em Christopher Park logo ao lado, o Stonewall Inn servia como domicílio estável. (…) A decisão da polícia de invadir o bar como invadiu pode ter sido influenciada pelo fato de que a maioria dos ‘homossexuais’ que eles encontrariam lá eram pessoas de cor, e portanto ainda mais repreensíveis.”

O roteirista Martin Luz resumiu bem um dos grandes problemas de Stonewall em um artigo para o site Huffington Post: por que seria necessário criar um personagem fictício (e cis, e branco) para contar a história da revolta de Stonewall, quando o que não falta nessa narrativa são personagens históricos interessantes que poderiam protagonizar o filme? “É o trabalho do roteirista imaginar como é a vida de outra pessoa. Falar com a voz dela. Enxergar o mundo por sua perspectiva. Pensar como ela pensa e contar ao público como é viver sob o ponto de vista daquela pessoa. Se o escritor acha que essa tarefa é difícil, é obrigação do roteirista se educar e fazer todo o possível para realizá-la bem. É algo que requer perseverança intelectual e psicológica. Requer humildade. Baitz evitou esse risco e preferiu escrever sob o ponto de vista que lhe era mais confortável. Ou talvez ele preferiu escrever a história sob o ponto de vista que o produtor achou que seria mais viável comercialmente. Seja qual for o motivo, esse ponto de vista que eles escreveram e criaram é uma degeneração da história real.”

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13 comentários

Daniel

Se esse filme for protagonizado por latinos,negros,afeminados, trans e drags. Pode ter certeza que o filme não vai fazer sucesso

Guto

Que pena! Adoro ler sobre Stonewall. É triste saber que o filme não vai ser fidedigno.

All

O que esperavam? O filme é feito por gays brancos cisgeneros para gays brancos cisgeneros. Sao esses que encabeçam os movimentos LGBTs mundo afora. Em todo caso, vou assistir pois gostei do trailer. Apenas acho que não.superará Milk.

Rodrigo

Os protagonistas de fato não cabem no elenco né, agora homem branco cis tá diboas, cabe tranquilo. Cada uma viu….

James Cimino

Ai, né? Cada ideia… Podia botar a Laverne Cox pra fazer a protagonista.

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