Telebiografia de Whitney Houston omite relacionamento lésbico

A estrela teria namorado a assistente Robyn Crawford durante toda a juventude; homofobia teria sido a principal causa da depressão e morte de Houston, diz jornalista

por Marcio Caparica

O canal de TV a cabo norte-americano Lifetime está prestes a estrear um filme biográfico sobre a vida de Whitney Houston. Dirigido por Angela Basset (de American Horror Story: Coven e American Horror Story: Freak Show, em seu début como diretora), Whitney traz as atrizes Yaya DaCosta no papel de Houston e Yolanda Ross no papel de Robyn Crawford, a assistente pessoal da cantora por todo o começo de sua carreira. E, apesar de nunca oficialmente confirmado, também sua namorada durante boa parte de sua vida.

Whitney Houston conheceu Robyn Crawford aos 16 anos e logo as duas tornaram-se inseparáveis. As duas moraram juntas mesmo depois que Whitney vendeu 13 milhões de cópias de seu álbum de estreia, Whitney, em 1985. Em entrevista à revista Time, a estrela disse que a assistente era “a irmã que eu nunca tive”. Crawford continuou uma presença constante ao lado de Houston por todo o início de sua carreira, seu sucesso como cantora, seu auge com o filme O guarda-costas, e seu casamento com o também cantor Bobby Brown. Consta que o relacionamento entre as duas era um “segredo aberto” dentro do mundo da música (o blogueiro Daryl Deino relata que elas não faziam esforço algum para esconder seu afeto durante as sessões de gravação), mas ele nunca foi oficializado: mesmo depois da morte de Whitney Houston em 11 de fevereiro de 2012, Crawford manteve sigilo sobre os detalhes de sua relação com a estrela pop. O máximo que fez foi escrever um obituário comovente sobre ela, publicado na revista Esquire, que termina com o seguinte parágrafo:

Eu nunca havia me pronunciado sobre ela até agora. Ela sabia que eu não faria isso. Ela foi uma amiga leal, e sabia que eu jamais seria desleal com ela. Eu nunca a trairia. Agora eu não consigo acreditar que eu jamais irei abraçá-la ou ouvir sua risada novamente. Eu amava sua risada, e isso é do que eu vou sentir mais falta, do que eu já tenho mais saudade.

Yaya Dacosta e Yolanda Ross como Whitney Houston e Robyn Crawford em cena do filme

Yaya Dacosta e Yolanda Ross como Whitney Houston e Robyn Crawford em cena do filme

O filme tratará de temas controversos da vida da diva, como seu abuso de drogas e seu casamento turbulento, mas não retratará uma relação romântica entre as duas. A disputa entre a assistente e o marido pelo afeto da cantora está no roteiro, no entanto. Yolanda Ross declarou ao site The Wrap: “[Robyn] era alguém que cresceu com ela desde os 16 anos, era a pessoa que estava com ela desde antes da fama. Nós não podemos dizer se havia algo a mais em termos de serem um casal, porque nunca foi confirmado. Mas eu imagino como deve ser, estar tão próxima de alguém, e então esse alguém começar a se envolver com outra pessoa. Sendo humano, os ciúmes, a mágoa vêm à tona. Como atriz, eu interpretei todas essas emoções. Eu interpretei o papel como alguém que amava a outra pessoa.”

Em fevereiro de 2012, pouco após a morte de Whitney Houston, o jornalista britânico Peter Tatchell publicou um artigo no jornal The Daily Mail em que dizia com todas as letras: Whitney e Robyn foram namoradas, e a necessidade de ocultar e reprimir seu amor por Robyn foi o que levou Whitney ao casamento com Bobby Brown, à depressão, ao abuso de drogas e à morte. Confira abaixo a tradução do artigo.

Eu conheci Whitney Houston e sua parceira na vigília Reach Out & Touch HIV em Londres em 1991.

Whitney discursou em apoio às pessoas com HIV de forma comovente, numa época em que muitas outras estrelas se mantinham à distância. Seu apoio foi muito valorizado. Ela batalhava pelo bem estar e direitos humanos das pessoas com HIV. Foi uma posição louvável.

Em tempos passados eu deixei de citar o nome da parceira de Whitney. Mas a maioria dos meios de comunicação já revelou que se trata de Robyn Crawford. Quando eu as encontrei, era óbvio que estavam loucamente apaixonadas. A intimidade e o afeto entre elas eram tão meigos e românticos. Elas davam-se as mãos no banco de trás do carro, como namoradas adolescentes. Claramente mais do que simples amigas, elas faziam um casal lindo e estavam tão felizes juntas. Ver seu amor era contagiante e arrebatador.

Quando esteve com Robyn, Whitney esteva feliz como nunca e no auge de sua carreira. Infelizmente, ela sofreu pressões de sua família e de sua igreja para por fim a seu maior amor de todos. Ela temia os efeitos que os rumores de que era lésbica causariam em sua família, sua reputação e sua carreira. Até que cedeu. O resultado? Um casamento surpresa com Bobby Brown.

Whitney, (esquerda) com Bobby Brown, sua mãe Cissy e (direita) Robyn Crawford

Whitney, (esquerda) com Bobby Brown, sua mãe Cissy e (direita) Robyn Crawford

O casamento foi um desastre. Bobby, o bad boy, nunca foi sua alma gêmea. Abrir mão de Robyn – elas haviam sido inseparáveis por anos – deve ter sido um trauma emocional. A vida de Whitney começou a ir para o ralo logo depois. Antes alguém saudável e sem vícios, ela passou a cair na bebedeira e a abusar das drogas – indícios de uma vida pessoal problemática e de muita infelicidade.

É muito provável que sua separação de Robyn tenha contribuído para seu abuso de entorpecentes e seu declínio. Há uma correlação conhecida entre a negação da própria sexualidade e a propensão a comportamentos autodestrutivos. A homofobia sem dúvida colocou Whitney sob mais pressão e acelerou seu falecimento.

Pouco depois de sua triste morte, eu fui citado por dizer que Whitney nunca foi tão feliz como quando amou uma mulher. Alguns fãs me acusaram de “insultá-la” e “conspurcar sua imagem”.

Mas não há nada vergonhoso quando uma mulher ama uma mulher. Não é sujo nem sórdido e não é algo que deveria ser ocultado.

Eu não a tirei do armário como lésbica/bissexual. Ela se declarou parcialmente quando dedicou seus álbuns a Robyn. Anos atrás, ela foi tirada do armário pela irmã de Bobby, Tina, e por seu ex-guarda-costas, Kevin Ammons.

Bobby Brown insinuou em sua autobiografia que ela havia se casado com ele para dispersar os rumores de que fosse lésbica: “Eu acredito que seu objetivo era limpar sua imagem… A mídia estava acusando-a de ter um relacionamento bissexual com sua assistente, Robin [sic] Crawford… isso não fazia muito bem para sua imagem. Na situação em que Whitney se encontrava, a única solução era se casar… para eliminar todos os rumores.”

Dizer a verdade não conspurca a memória de Whitney. Dizer a verdade honra o relacionamento mais importante que ela já teve. O que é errado é ignorar ou negar o único amor que a fez realmente feliz. A homofobia contribuiu para a derrocada de Whitney.

Eu quero ver uma sociedade mais tolerante, em que as pessoas não sintam a necessidade de se casarem para abafar os rumores de homossexualidade, e em que elas não sejam levadas à autodestruição por causa de sua inabilidade de aceitar e expressar seu amor por uma pessoa do mesmo sexo.

Alcançar esse objetivo seria um tributo digno para Whitney Houston.

Whitney estreia nos EUA em 17 de janeiro.

Apoie o Lado Bi!

Este é um site independente, e contribuições como a sua tornam nossa existência possível!

Doação única

Doação mensal:

Um comentário

Comments are closed.