Neste último sábado, dia 12 de outubro, o boxeador Orlando Cruz perdeu a disputa pelo cinturão mundial dos peso-pena contra o mexicano Orlando Salido. Cruz caiu de joelhos e não conseguiu se levantar mais, recebendo o countdown aos 1:05 minutos do sétimo round. O derrotado usava shorts com as cores da bandeira do arco-íris, e suas luvas tinham detalhes cor-de-rosa.
Dar a cara a bater e o nariz a quebrar numa luta de boxe muitos homens fazem. Se propor a fazer isso exibindo para quem quiser ver que é gay, até agora, só Orlando Cruz.
Boxeador desde os sete anos, Cruz já tinha ganhado sete títulos nacionais e sete medalhas de ouro internacionais. Em 4 de outubro de 2012 o lutador soltou uma nota à imprensa em que ele se declarava homossexual:
Eu luto há mais de 24 anos, e, seguindo a ascensão da minha carreira, eu quero ser verdadeiro comigo mesmo.
Eu quero ser o melhor modelo possível para as crianças que considerem o boxe como esporte e carreira profissional.
Eu tenho e sempre terei orgulho de ser porto-riquenho. Eu tenho e sempre terei orgulho de ser um homem gay.
A declaração tirou um peso de seus ombros, como ele declarou ao jornal britânico The Independent. “Eu agora me sinto livre para me preocupar apenas com o boxe. Eu não tenho mais que lutar contra dois oponentes, e isso é um grande alívio. Acabaram-se as noites passadas em claro chorando.”
Sua carreira continuou realmente em ascensão, e conforme a grande luta pelo título mundial se aproximava, o boxeador aproveitou para deixar bem claro que é possível ser gay e bom de briga. Dia 15 de agosto ele publicou um vídeo no Facebook em que pedia o namorado José Manuel em casamento. Na sexta-feira antes da disputa pelo título, ele mostrou a bermuda do arco-íris e as luvas rosa que vestiria no embate. E apareceu com uma cuequinha do arco-íris para a pesagem.
Ele sabia bem que seria muito difícil o combate não passar para o lado pessoal. “[Orlando Salido] é profissional, mas os mexicanos costumam ter algo de homofóbico. É a cultura machista. Ele não vai querer perder para um gay. Salido vai ser muito mais agressivo. Mas esse machismo vai ser a armadilha em que ele vai cair”, Cruz disse em entrevista ao jornal The Guardian pouco antes da luta.
Ao entrar na luta, Orlando Cruz foi vaiado e ovacionado. Suas habilidades no ringue não foram o suficiente para que pela primeira vez alguém abertamente gay fosse campeão mundial de boxe.
(Já houve enrustidos. Emile Griffith, que faleceu dia 23 de julho aos 75 anos, foi campeão dos meio-médios e pesos-médios. Em 24 de março de 1962, durante a pesagem, seu oponente Benny Paret o provocou chamando-o de “maricón”. Um Griffith enfurecido venceu a luta por nocaute, com tanta agressividade que Paret foi inconsciente para o hospital e morreu dez dias depois. Ele teve um breve casamento com uma mulher, mas viveu a maior parte de sua vida após se aposentar com um “filho adotivo”. Em 1992 o lutador já aposentado quase morreu ao ser atacado por uma gangue na saída de um bar gay em Nova York, e em 2005 declarou à revista Sports Illustrated que era bissexual. No livro Nine… Ten… and Out! The Two Worlds Of Emile Griffith, ele resumiu a contradição de sua vida: “Continuo a me perguntar como tudo isto é estranho. Mato um homem e a maioria entende e perdoa. Sem vergonha, amo um homem e essas mesmas pessoas consideram que é um pecado imperdoável. Embora nunca tenha ido para a prisão, passei na prisão toda a minha vida.”)
Dessa prisão, pelo menos, Cruz já escapou. E com lutadores como esse, o esporte vai ficando menos homofóbico.