Semana passada o governador do estado norte-americano de Indiana, Mike Pence, sancionou uma lei estadual que dá permissão para estabelecimentos comerciais discriminarem seus clientes – LGBTs em particular – com base nas crenças religiosas de seu dono. Disfarçada com o título de “Lei de Restauração da Liberdade Religiosa” (Religious Freedom Restoration Act, ou RFRA), a legislação foi aprovada pela assembleia legislativa do estado como reação ao movimento nacional que avassaladoramente vem aprovando o casamento LGBT por todos os EUA e que, em breve, deve fazer com que o casamento igualitário se torne uma realidade nacional.
O Projeto de Lei de Senado 101, como a lei também é conhecida, diz que o estado não pode “impedir substancialmente o exercício da religião de uma pessoa” a não se que haja um “interesse governamental” para fazê-lo – e a definição de “pessoa” aqui seria um “indivíduo, organização, sociedade religiosa, igreja, corporação, companhia, associação ou outra entidade”. Outros estados – e até o governo federal norte-americano – já têm leis similares, criadas com a intenção de impedir que o governo interfira nas práticas de religiões minoritárias. Mas a de Indiana é mais problemática porque conta com uma cláusula que explicita que a “pessoa” pode impor suas objeções religiosas “esteja ou não o estado ou qualquer outra entidade governamental envolvida no procedimento”. Ou seja, essa lei permite que qualquer pessoa física ou jurídica levante esse tipo de objeção – sob medida para amparar fotógrafos, floristas, confeitarias e outros negócios que recentemente vêm se negando a atender casamentos homoafetivos, por exemplo.
A reação nacional foi veloz. Vários negócios e instituições afirmaram o que deveria ser óbvio: não é possível oferecer um serviço de qualidade quando não se pode garantir que todos os clientes serão atendidos igualmente, sem ficar à mercê da religião da pessoa que está atendendo. Jeremy Stoppelman, CEO do app Yelp!, declarou que sua companhia não investirá mais no estado (nem em nenhum com legislação similar). O CEO do site Salesforce.com, Marc Benioff, anunciou que sua empresa não levará mais ninguém ao estado nem fará qualquer investimento lá – não quer que seus funcionários corram o risco de serem discriminados. Tim Cook, CEO da Apple, publicou ontem uma carta aberta no jornal The Washington Post condenando a lei de Indiana. O CEO da Gen Con, uma das maiores convenções de games do país, afirmou que está reconsiderando realizar o evento no estado de Indiana, onde acontecia anualmente, com isso privando o estado de 50 milhões de dólares. Até a banda Wilco resolveu cancelar um show no Estado, conforme anúncio feito no Facebook.
A reação política também foi imediata. O prefeito de San Francisco, Ed Lee, afirmou que sua administração não gastará mais um centavo com qualquer coisa ligada ao estado de Indiana, como forma de demonstrar que a cidade se opõe a essa medida discriminatória: “os contribuintes de San Francisco não subsidiarão discriminação sancionada legalmente pelo estado de Indiana contra lésbicas, gays, bissexuais e transgêneros”, declarou. O prefeito de Seattle, Ed Murray, tomou a mesma decisão, assim como Charlie Hales, prefeito de Portland, no Oregon. Não são medidas indolores para Indiana: o PIB da área de San Francisco foi de 535 bilhões de dólares em 2011; o da região de Seattle, 285 bilhões de dólares em 2013; o de todo o estado de Indiana foi de 262,6 bilhões em 2009. O governador do estado de Connecticut, Dan Malloy, também anunciou que seu estado não gastará mais com viagens para Indiana.
O governador Mike Pence passou os últimos dias tentando lidar com os efeitos nocivos de sua decisão de sancionar essa lei. Primeiro tentou afirmar que a intenção da legislação não é discriminar contra LGBTs, e que proporia uma lei adicional para “esclarecer” os fatos (na segunda-feira a equipe do governador anunciou que está trabalhando nessa emenda). No último domingo, já passou a dizer que esse barulho todo não passa de um complô dos ativistas LGBT contra uma lei inocente – mas, durante uma entrevista num programa de domingo, o governador se esquivou seis vezes de responder “sim” ou “não” quando perguntado se essa lei permitira que LGBTs fossem discriminados. Difícil de acreditar na inocência do governador: no ato da sanção da lei, ele posou para um retrato rodeado de personalidades que se dedicam a discriminar a população LGBT.
A primeira página do Indianapolis Star, o principal jornal da capital de Indiana, Indianapolis, reservou toda sua primeira página a um editorial contundente: “Lei de Restauração da Liberdade Religiosa: conserte isso agora”, diz a manchete que ocupa a página inteira. O texto diz: “Muito está em risco. Nossa imagem. Nossa reputação como um estado que acolhe pessoas de históricos diversos e os faz sentirem-se bem-vindos. E nossos esforços ao longo de vários anos de reconstruir nossa economia, de atrair trabalhadores talentosos e empreendimentos bem-sucedidos, e melhorar a qualidade de vida de milhões de habitantes de Indiana. Governador Mike Pence e a assembleia precisam aprovar uma lei estadual que proíba a disciminação no trabalho, na moradia, na educação e acomodações públicas baseada na orientação sexual ou identidade de gênero de uma pessoa.” O prefeito de Indianapolis, Greg Ballard, se adiantou e assinou ontem um decreto que garante esse tipo de proteção dentro da cidade.
Não é a primeira vez que um dos estados dos EUA tenta aprovar uma legislação desse tipo. Em fevereiro do ano passado uma lei semelhante foi aprovada pelo senado do estado de Montana, mas foi vetada pela governadora Jan Brewer – não porque ela considerasse a lei errada, mas porque quis evitar que Montana fosse alvo da mesma reação negativa que agora recai sobre Indiana. Outros 13 têm projetos parecidos tramitando em sua legislatura com a intenção de afirmarem “direitos de discriminar” tão amplos quanto os de Indiana. Em tempos de conservadorismo, vários políticos estão se valendo dessa polêmica para agradar seus eleitores: a assembleia legislativa do estado de Arkansas promete seguir com a sua mesmo que as represálias contra Indiana se estendam a seu estado. A versão que tramita no estado da Carolina do Norte seria ainda pior: permitiria também que hospitais se recusassem a atender LGBTs.
No fundo, esse tipo de atitude só demonstra a mesquinharia e covardia daqueles que lutam contra os direitos LGBT. Mesquinharia porque os habitantes de Indiana já podiam discriminar por orientação sexual e identidade de gênero (e ainda podem): não há legislação ali que considere LGBTs uma classe protegida. Esse tipo de legislação para defender “a crença religiosa” não passa de birra de conservadores, ressentidos que o corpo judiciário do estado fez valer o casamento igualitário no final do ano passado. Covardia porque, mesmo que a lei venha a ser mantida, dificilmente os estabelecimentos que decidirem fazer uso de sua “liberdade religiosa” vão fazer o que seria então correto e colocarem placas na entrada avisando que não atendem LGBTs, poupando previamente os clientes indesejados de qualquer constrangimento, mesmo que à custa da própria imagem. Gente com esse tipo de atitude prefere o conforto de tentar humilhar as outras pessoas na surdina, individualmente, com o conforto de algum amparo legal, se possível, mas sem perder a possibilidade de posarem como “cidadãos de bem” – e não os preconceituosos que são.
Duas coisas precisam ficar claras: um, que pessoas jurídicas de qualquer espécie não têm direitos religiosos: religião é algo inerente a pessoas. Empresas não têm alma, por definição. Segundo, prestar um serviço não quer dizer que você apoia seja o que for. Um carteiro não precisa concordar com o conteúdo da correspondência que entrega para fazê-lo. Uma fábrica de família judaica pode produzir hóstias sem que isso cause conflitos éticos nem para a fábrica nem para a igreja que é seu cliente. Um florista pode fornecer flores para um casamento entre dois homens e continuar achando que eles estão agindo errado. Ninguém supõe que por causa dos milhares de dólares que ele recebeu de um casal de homossexuais, ele concorde com o matrimônio entre eles. Assim como ninguém pensaria que o florista ateu se converteu ao catolicismo porque vendeu flores a um funeral católico. Negar esse tipo de serviço não passa do mais puro despeito, e da vontade de causar dissabor em um momento que deveria ser pura felicidade na vida de duas pessoas.
Nesse caso o tiro saiu pela culatra, e essa lei só rendeu um eixo em torno do qual LGBTs e seus aliados se organizarem. Outros estados começaram a abafar seus projetos de lei similares. Mike Pence, que pretendia se candidatar à presidência, já pode dizer adeus à disputa. O mundo inteiro agora concorda com Miley Cyrus: Mike Pence, você é um cuzão.
gente, isso é uma espécie de primeiro de abril?
Hahahahaha! Não, não é o Sensacionalista! E o boicote contra Indiana tá pegando mais forte. A Walmart tá contra e os Estados de NY e Connecticut também boicotaram.
Do q adianta essas manifestações se a lei já foi aprovada? o governador já deu o intimato e p essa lei ser promulgada é porq ele teve apoio afinal ele não governa sozinho, eu vejo q cada vz mais essas leis podem ser implementadas polos países a fora, isso é um tapa na cara de bichas escandalosas q ficam se pegando em público na minha opinião a intimidade deve ficar entre 4 paredes e eu vou incluir os hereros tmb antes q eu seja acusado de homofobia . P vcs verem né q nos USA as coisas não estão as mil maravilhas p a bicharada, ainda tm gnt q paga pau p eles.
Adianta que provocam mudanças. O governador Mike Pence acabou de anunciar que vai fazer emendas nessa lei para garantir que LGBTs não sofram discriminação. http://www.huffingtonpost.com/2015/03/31/indiana-religious-freedom_n_6977170.html
Desde quando se pegar em público é coisa de “bixa escandalosa”?
Isso é apenas pra provar que temos os mesmos direitos! Sair nas ruas adianta sim, se pensarmos que ficar em casa sentados postando algo vai ajudar o pais em alguma coisa, não vai, temos de lutar por liberdades iguais!