Mesmo os espaços tradicionalmente mais avessos às minorias podem se abrir à diversidade. É o que querem provar as forças armadas britânicas, que recentemente lançaram uma campanha voltada especificamente ao recrutamento de mais mulheres, pessoas LGBT e muçulmanos.
A campanha, entitulada Belonging 2018 (“Pertencimento 2018”) consiste de cinco animações, narradas por soldades reais. Os vídeos buscam responder questões como “Posso ser gay no exército?”, “Posso praticar minha fé no exército?” e “Vão me dar ouvidos no exército?” (esse último, voltado às mulheres). Outros dois vídeos buscam combater a masculinidade tóxica que é comumente associada às forças armadas: “Eu tenho que ser um super-herói para entrar no exército?” (para quem não está em forma) e “O que acontece se eu ficar emocionado no exército?”.
O exército britânico, garantem os vídeos, é um lugar que dá oportunidades iguais a pessoas de todos os gêneros, e em que um soldado pode sentir-se à vontade para comentar que namora outro homem, assim como seus colegas comentam sobre suas namoradas. As diferentes religiões todas têm lugar, e práticas como as cinco orações diárias dos muçulmanos são respeitadas.

Posso rezar no exército?
A campanha vem em decorrência nas mudanças demográficas e culturais do Reino Unido. O general Sir Nick Carter, chefe do exército britânico, explicou no programa Today da BBC Radio 4: “os recrutas do exército tradicionalmente são homens brancos e jovens entre os 16 e 25 anos, mas as mudanças demográficas do país fazem com que já não haja mais tantas pessoas nesse perfil quanto antes. Nossa sociedade está se transformando, e acho que é absolutamente adequado que, portanto, nós tentemos alcançar uma base mais ampla, para conseguir os talentos necessários para manter nossa força de combate.”

“Vão me dar ouvidos?”
Infelizmente as críticas daqueles que ainda pensam com a cabeça do século passado também acontecem no Reino Unido. “O exército, assim como o resto do governo, está se deixando levar para o caminho do politicamente correto”, reclamou o coronel aposentado Richard Kemp no programa BBC Breakfast. “O que é mais importante é que o exército esteja repleto de soldados. É secundário se esse exército reflete a composição da sociedade”.

Posso me emocionar no exército?
Outras críticas muito mais razoáveis foram feitas a outra prática de recrutamento do exército: aceitar candidatos entre os 16 e 18 anos. “É positivo que as forças armadas estejam considerando maneiras de serem mais inclusivas e mostrar que a saúde emocional dos soldados é uma prioridade”, apontou Reem Abu-Hayyeh, membro da organização Medact. “No entanto, nossas pesquisas demonstram que os jovens recrutados pelo exército correm riscos maiores de estresse pós-traumético, automutilação e suicídio. O Reino Unido é um dos poucos países que ainda recruta pessoas com 16 anos para o exército. A melhor maneira do exército proteger a juventude é não recrutar ninguém com menos de 18 anos.”
Way Sharrocks, um ex-soldado que hoje atua na organização Peace Pledge Union, concorda e aponta inconsistências entre a campanha e a realidade: “punições físicas brutais são lugar-comum. O medo de se questionar ordens é forjado logo cedo, e o exército faz uso de técnicas sofisticadas para remover a aversão a matar. Tudo isso tem efeitos negativos na saúde mental dos soldados.” Se campanha como a Belonging 2018 são sinais de que a cultura no exército está evoluindo, práticas desumanizantes como estas provam que ainda há muito o que ser feito.