hanging man and three people in bed

Por que pênis na vagina se tornou o padrão para “sexo”?

Regras estabelecidas da Idade Média por coroas que não podiam fazer sexo estragam a diversão de todo mundo até hoje

por Marcio Caparica

Traduzido do artigo de Eleanor Janega para o site Bish

Todo tipo de sexo é sexo “de verdade”. O nome já diz tudo. Se você tem que usar a palavra “sexo”, certeza que você está fazendo sexo.

Isso posto, quando alguém diz a palavra “sexo”, a maioria das pessoas pensam automaticamente em uma coisa – pênis dentro da vagina, ou ????????????????. Mas por quê? Será que esse é o tipo de sexo que dá mais prazer? Ou será que isso acontece porque é o tipo de sexo que a maioria das pessoas pratica? A resposta, na verdade, é um pouco mais complicada; suas raízes estão na Idade Média, e nós lidamos com suas consequências ainda hoje.

A era medieval foi, tipo, bem importante

A Idade Média é mais ou menos o período de mil anos que vai da queda de Roma (476 d.C.) até quando Martinho Lutero contestou os preceitos da igreja Católica e tomou conta do pensamento de boa parte da Europa (1517 d.C.). Afirmar que o período medieval termina no momento em que a Igreja não mais controla toda a Europa denota algo muito importante sobre essa época: que a Igreja Católica era o fator mais importante durante esses tempos, e ela decidia o que era certo ou errado.

Quem vivia na Europa medieval era praticamente católico por definição (com a exceção da Espanha – uma região extremamente diversa, cheia de judeus e muçulmanos). Isso quer dizer que a Igreja Católica decidia, na maior parte da Europa, quem ia para o Céu e quem ia para o Inferno. No início da idade Moderna os europeus resolveram sair por aí colonizando tudo, levaram consigo a Igreja e seu sabor predileto de cristianismo, e forçaram todos que esbarravam neles a adotarem essa religião. Ou seja, a gente ainda está lidando com essas ideias ao redor do mundo todo, não apenas na Europa.

A Igreja era a patrulha sexual

A Igreja tinha o poder de decidir o que cada um tinha que fazer para conseguir ir para o Céu. Com isso ela ganhava o poder de definir quando elas deveriam ir para a missa, quando deveriam fazer jejum, e quando e como podiam fazer sexo.

Não é surpresa nenhuma que um bando de caras que não tinha permissão para fazer sexo (o clero, ou seja, padres e monges que eram obrigados a fazer um voto de castidade) achava que, se eles não podiam se divertir, ninguém mais podia também. Foi assim que a cultura europeia acabou presa a uma porção de regras super estritas sobre que tipo de sexo as pessoas podiam fazer.

Padre medieval vigiando duas pessoas fazendo sexo.

A patrulha do sexo chegou!

Segundo a Igreja, as pessoas só podiam fazer sexo se, especificamente 1) eram um homem e uma mulher; 2) eram casados; e 3) estavam tentando engravidar.

Sodomia não é bem isso que você está pensando

Obviamente, se a permissão para se fazer sexo só era dada para quem estava tentando engravidar, o único tipo de sexo que se podia praticar era aquele que possivelmente poderia engravidar alguém. Qualquer outro tipo de sexo que não era capaz de produzir filhinhos era tachado de “sodomia” pela Igreja. Esse termo vem da história da destruição da cidade de Sodoma, a fuga de Lot e tudo mais que está descrito nos capítulos 18 e 19 do Gênesis. (Todo mundo deveria ler essa história um dia, é uma loucura.)

Hoje em dia, quando se escuta a palavra “sodomia”, o que vem à mente é “sexo gay”; provavelmente, sexo anal entre dois homens cis, para ser mais específico. Isso só acontece porque qualquer tipo de sexo entre dois homens cis é, por definição, sodomia, já que ninguém vai engravidar com isso. Acontece que sodomia é, literalmente, qualquer coisa que duas pessoas fazem apenas por prazer sem a possibilidade de gerar um bebê.

Ou seja, estão na lista o sexo oral, a masturbação mútua, bolinação, pegação e todas essas outras maneiras maravilhosas de sexo que todo mundo gosta tanto de fazer. Tudo proibido porque essas atividades nunca engravidaram ninguém, e o único motivo válido para se fazer sexo era fazer filhinho. Também era proibido fazer sexo quando a mulher estava menstruando, ou grávida, ou amamentando, pelas mesmas razões.

Mesmo quando duas pessoas casadas faziam sexo com a intenção de engravidar ainda havia uma porção de regras a serem seguidas. Nada de sexo durante a quaresma. Nem um mês antes do Natal. Nem durante a Páscoa. Nem às quartas, quintas, sextas, sábados ou domingos. Nem durante o dia. E nada de tirar toda a roupa. Posições, só papai-e-mamãe. E sem beijo na boca.

Padre conferindo a posição sexual de um casal em gravura da idade média.

Fiscal de foda, que gostoso.

Quem era pego se divertindo durante o sexo, ou admitisse que se divertiu (ou seja, que havia praticado sodomia) poderia ser punido. A partir do século 12, homens que eram pegos fazendo sexo homossexual podiam serem forçados a pagar multas, terem suas propriedades confiscadas, serem castrados ou até mortos. Pessoas heterossexuais que eram pegas com a boca na botija, ou que admitiam aos padres que tinham feito amor gostoso, geralmente recebiam penitências, ou seja, tinham que se submeter a alguma punição criada pela Igreja. As pessoas eram submetidas a jejuns (comer apenas vegetais e beber apenas água) de até três anos se curtissem algo que não era “natural”. Quem era pego pulando a cerca podia até ser executado.

Dá pra perceber o que a Igreja fez? A intenção era acabar com qualquer diversão que as pessoas poderiam ter durante o ato sexual, e transformá-lo em algo que só servia para a procriação. As pessoas tinham que fazer sexo bem rápido, engravidarem, e daí ficarem esperando até a hora de fazer outro filho para transarem de novo. Essa é a origem dessa ideia de que o único tipo de sexo “que conta” é quando o pênis entra na vagina: um bando de coroas que não podiam trepar, e portanto não queriam que ninguém mais se divertisse.

A Igreja e o povo são coisas bem diferentes

Mas é claro que, assim como acontece hoje, as pessoas da Idade Média não entraram nessa fria. Elas continuaram a transar como bem queriam. A gente sabe disso porque a Igreja estava sempre reclamando, as histórias de amor cortês eram ilustradas com imagens dos personagens transando, e monges entediados viviam rabiscando figuras de pessoas fazendo sexo oral nas margens dos livros.

Mulher masturbando homem em ilustração medieval.

Punhetinha medieval no jardim.

Desenho de cunilíngua feito na borda de livro medieval.

“Fica quietinha, não é pra ser bom!”

Existem até cartas e memórias em que as pessoas descrevem as trepadas delicinha que fizeram. A população não parou de transar das mais variadas maneiras só porque essas variantes não contavam como sexo “de verdade”, ou porque a Igreja dizia que quem ousasse fazer borbulhas de amor ia para o Inferno. Afinal de contas, é bom.

Moral da história? Seja mais como as pessoas da Idade Média, e menos como a igreja da Idade Média. Continue a fazer o que você e seu parceiro tiverem vontade de fazer, e não se preocupe se isso é ou não é “sexo de verdade”. Se você gosta de fazer, então vale a pena. Não permita que um bando de coroas que morreu há séculos ditem o que você tem permissão de fazer.

Eleanor Janega é doutora em História Medieval e professora assistente na Queen Mary University em Londres. Siga-a no Twitter e confira seu blog.

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12 comentários

Bernard

Legal mas comentário vários feira de contexto. Não é porque os padres não faziam sexo ou porque existiam casamento com velhos. Quando vc comenta essas coisa foge completamente da questão. Até porque padres casaram em até certo momento do cristianismo e podiam ter famílias e fazer sexo. Essa questão é oriunda de heranças Judaicas transportadas para o cristianismo e o credo onde todo o tipo de prazer era pecaminoso.

Roger Almeida

Eu, na minha inocência, pensava que introduzir o pênis na vagina era o sexo padrão pra maioria das espécies de animais, como cachorro, o porco, cavalo, além de outros bem mais exóticos…

Marcio Caparica

Bem, pensando assim, você poderia também restringir sua vida sexual a uma ou duas semanas do ano quando sua espécie entrar no cio, assim como o cachorro, o porco, o cavalo e outros animais bem mais exóticos.

Arthur Pereira

Acho que como o sexo vaginal é o responsável pela reprodução, ele era o mais instintivo pras espécies sexuadas. Inclusive, me parece plausível que a evolução tenha adaptado os órgãos sexuais para serem mais compatíveis entre si do que, por exemplo, um pênis e um ânus. Não dizendo que sexo sem reprodução não é sexo, mas que faz sentido com a evolução o sexo vaginal ser o “padrão”. O resto foi fruto da criatividade hahaha

roberto

A evolução vai muito alem da procriação!

Varias especies usam o sexo como forma de mantar a paz dentro da tribo. Sexo é fonte de prazer!

Samuel

Caramba, eu detesto esse estilo Vice pretensamente cool de se escrever textos. E a mulher podia ter citado as fontes.

SamuelChaaaaaato

Caramba, custa ler que o texto original foi publicado em inglês e que está descrito no início da publicação, e que ao final, na nota de rodapé tem o nome da autora, blog, twitter e afins.
Vai lá refutar o PhD dela com seus “gostos” ou pedir fontes.

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