A co-diretora da trilogia Matrix e co-criadora da série Sense8, Lilly (antes Andy) Wachowski, 48 anos, declarou-se transgênero em uma declaração para o jornal The Windy City Times. Lilly Wachowski conta que tomou essa decisão após ser abordada por um jornalista do jornal britânico Daily Mail. Confira o que ela publicou, traduzido abaixo:
Pois é, eu sou transgênero.
E, sim, eu fiz a transição.
Eu já havia me declarado para meus amigos e familiares. A maioria das pessoas com quem eu trabalho também sabem disso. Ninguém se importa. Sim, eles já passaram por isso antes, graças a minha irmã fabulosa, mas eles também são pessoas fantásticas. Sem o amor e o apoio da minha esposa e amigos e familiares, eu não estaria onde estou hoje.
Mas essas palavras, “transgênero” e “transição” são difíceis para mim, porque as duas perderam sua complexidade quando foram assimiladas pela cultura em geral. Há uma falta de nuance de tempo e espaço. Ser transgênero é algo que em grande parte se entende existir dentro dos extremos dogmáticos de homem e mulher. E “fazer a transição” comunica uma sensação de urgência, um antes e depois de um extremo ao outro. Mas a realidade, minha realidade, é que eu já venho fazendo a transição e continuarei a realizá-la por toda minha vida, através do infinito que existe entre o masculino e o feminino, assim como o que existe entre o binário do zero e o um. Nós precisamos elevar o diálogo para além da simplicidade do binário. O binário é um ídolo falso.
Wachowski afirma que um repórter do Daily Mail veio até sua porta e pediu para tirar uma foto, e que também ele “precisava” fazer uma entrevista.
Eu e minha irmã Lana evitamos a imprensa na maior parte do tempo. Para mim, falar sobre minha arte é frustrantemente entediante, e falar sobre mim mesma é uma experiência completamente constrangedora. Eu sabia que em algum momento eu teria que vir a público. Sabe, quando você vive como uma pessoa abertamente transgênero é… meio difícil de esconder. Eu só queria – precisava de algum tempo para colocar minha cabeça no lugar, para me sentir confortável.
Mas, aparentemente, eu não posso decidir quando isso acontece.
Depois que ele me deu seu cartão, e eu fechei a porta, eu comecei a me lembrar de once que eu conhecia o Daily Mail. Era a organização “noticiosa” que havia tido um papel enorme em expor publicamente Lucy Meadows, uma professora de educação infantil e mulher trans do Reino Unido. Um editorial desse “não-tabloide” demonizou-a como uma influência danosa para a inocência delicada das crianças, e resumiu: “ele não está apenas preso no corpo errado, ele está no emprego errado”. A razão por que eu sabia dela não era porque ela é transgênero, mas porque, três meses depois que o artigo do Daily Mail foi publicado, Lucy suicidou-se.
E agora aqui estavam eles, na frente da minha casa, quase como quem diz –
“Olha outra lá! Vamos arrastá-la para a praça pública para que a gente consiga dar uma boa olhada!”
Wachowski conclui a declaração com uma citação a José Muñoz: “Ser queer é essencialmente sobre a rejeição de um aqui e agora e uma insistência na potencialidade de um mundo diferente”, e completa: “Eu continuarei a ser uma otimista, adicionando meus esforços à luta de Síssifo que é o progresso, e, em minha própria pessoa, ser um exemplo da potencialidade do mundo”.
Lana Wachowski, irmã de Lilly, veio a público como uma mulher trans em 2012. Agora, oficialmente, alguns dos maiores clássicos da ficção científica nas telas foram criados por pessoas transgênero. Comemoremos!
Como irmão de um menino e uma menina gays, tentando reunir todos da minha família, eu preciso perguntar à vocês. Duas pessoas do mesmo sexo tem todo o direito de ficarem juntas, etc. Elas não estão impondo nada a ninguém, nem vivendo uma mentira, muito pelo contrário. Agora, não venham dizer que certas pessoas “nascem” num corpo errado, só porque elas se se sentam mais masculinas ou femininas. Tenho certeza que meu irmão se sente uma mulher ás vezes. Gays que idolatram as divas só o fazem porque no fundo queriam ser um pouco daquilo. E é ok ser assim. Todo mundo sonha, é a nossa criança interior gritando “oie, ainda estou aqui”. Mas o que acontece com as pessoas transsexuais, na minha opinião, é realmente uma fuga. Geralmente são muito efeminadas ou masculinizadas e por não serem incluídas por pessoas do seu gênero, passam a viver uma fantasia onde são aceitas. Pior, encontra pessoas que, ao invés de ajudá-las a aceitar sua orientação homossexual/bissexual, as incentivam a fazer cirurgias desnecessárias, que acabam dificultando ainda mais sua vivência, infelizmente. Porque toda essa heteronormatividade? Porque não ser simplesmente um cara feminino ou uma menina masculina? LGB precisam abraçar realmente os “T” em sua comunidade.
Acredito que você não conhece pessoalmente nenhuma pessoa trans. Não extenda o exemplo de seus irmão homossexuais à realidade das pessoas trans. Identidade de gênero é algo separado da orientação sexual – tanto que pessoas trans podem ser homossexuais ou heterossexuais. Quando você chama de “fantasia” uma realidade dolorosa de milhares de pessoas, você está é excluindo os Ts da comunidade LGBT, não abraçando-os: no fundo, você está dizendo que a transgeneridade não é real.
Eu já conheci, sim, algumas pessoas transsexuais num centro LGBT. Foram poucas, mas não precisa ser um gênio para saber como sofrem. Salta aos olhos que a maioria viveria uma vida muito mais tranquila, sem genitalias no limbo e com parceiros sexuais se fossem orientadas que não precisam de uma cirurgia agressivíssima para sentir atração pelo mesmo sexo ou se sentir feminina, por exemplo. Até os homens heterossexuais tem um lado feminino também, sabiam dessa? Os “Ts” estão trocando a liberdade de andar livremente à luz do dia por uma farsa completamente evitável.
Como já disse, você está partindo de premissas totalmente erradas. Trans não estão fazendo cirurgias para se sentirem melhor por uma atração por pessoas do mesmo sexo. Pessoas trans podem ser homossexuais ou heterossexuais.