AVISO: Esse post contém spoilers. Muitos spoilers.
Quando a série Looking estreou, eu publiquei um post em que fazia algumas considerações sobre o primeiro episódio: disse basicamente que a nova série da HBO apresentava uma versão domesticada dos gays para facilitar sua aceitação por héteros, e comportada sexualmente para agradar os gays, já cansados de verem retratos hipersexualizados de si mesmos na mídia. A revolta dos leitores foi intensa. “Como você pode dizer isso depois de apenas um episódio?”, “Finalmente um seriado sobre gays que eu posso assistir com minha mãe, deixa de ser imbecil” e “Nosso universo não se reduz a pegação” foram apenas alguns dos comentários mais educados. Não me restou alternativa que me prometer a assistir ao resto da temporada para dar uma opinião final.
Pois finalmente consegui atravessar os oito episódios da primeira temporada. E devo dizer que estou impressionado com o resultado. Looking conseguiu construir uma história interessante baseada em três protagonistas absolutamente deploráveis. Isso é um feito de narração do qual poucos são capazes. E mostra que seus criadores têm um retrato do gay contemporâneo para mostrar sim, e não é tão cor-de-rosa quanto o que prometiam os primeiros episódios.
Com um sangue frio digno de Manoel Carlos, Looking nos arrasta por quatro episódios iniciais lentos . Nada de muito acontece. Os personagens são apresentados de maneira a seduzir tanto os gays carentes de retratos positivos como os héteros que buscam seu amigo gay ficcional. Todos são tão fofinhos, é irresistível! Dom, veja só, por trás daquele bigode cafajeste esconde um grande trauma amoroso e um sonho de abrir o próprio restaurante. Até na sauna ele é capaz de puxar uma conversa com o coroa ao lado. Agustín, o artista, acabou de ir morar com o namorado. Os dois até dividem um boy. Quem não gostaria de ter um relacionamento com essas possibilidades?
Mas a principal armadilha é Patrick, o personagem principal, encantador como só ele, o genro que todo viado gostaria de apresentar à mãe. Ele é bonito e sarado, mas fica sem graça de exibir o corpão na rua. Rodou tão pouco que nunca viu um pinto não-circuncidado (eles são raros nos EUA, eu sei, mas não tanto assim), e fica constrangido por fazer pegação no parque. Morre de vergonha por ter se insinuado para o chefe por engano e fica passado quando alguém o aborda no trem. E já disse que ele é lindo?
A pasmaceira começa a mudar no quinto episódio, que acompanha um dia de romance entre Patrick e Richie, seu boy latino. Então a trama começa a mostrar o lado feio de seus protagonistas, e a audiência, já amarrada por quatro semanas de fofice, não consegue mais fugir.
No último episódio Agustín tem que ouvir do namorado, Frank: “você não é o que pensa que é”. Serve de legenda para os três, e de sinal para o telespectador que ainda se recusa a processar o que aconteceu na reta final.
Agustín, vamos admitir, é o mais parecido com o gay o mundo real, e por isso mesmo o mais odiado pelo público. Deixa o tesão guiar suas decisões, engana o namorado sem refletir muito por que está fazendo isso, tem algo bom em sua vida mas coloca isso em risco por… tédio? Bem ou mal, é o único que toma atitudes para realizar o que deseja. Por mais moralmente condenável que isso possa ser. Se dá mal no fim, mas pode-se dizer que ele realmente tenha se arrependido do que fez? Acredito que não.
Dom entra em crise de meia-idade ao completar 40 anos. Decide então, para tentar preencher seu vazio existencial, que explorar a boa-vontade de um coroa para conseguir abrir seu business é algo válido. Por que não colocar o bigode sensual em uso se isso pode lhe render a oportunidade de ficar famoso preparando frango peri-peri? Dom se dedica a esse joguinho, incapaz de perceber que o coroa em questão, Lynn, já viu esse filme umas dez vezes antes.
Mas o mais desprezível dos três é mesmo Patrick, uma coleção de tantas características lamentáveis – e comuns – dos gays. Sua preocupação em projetar a imagem “correta” para os outros (seja amigos, sejam colegas de trabalho, seja família) é enorme. Só perde para a necessidade de projetar para si mesmo a imagem do que ele acha que deveria ser. E o Patrick real é bem distinto do Patrick autoidealizado. Ele se vê como alguém que respeita o relacionamento alheio, mas na realidade quer mais que tudo roubar o chefe casado para si. Considera-se sem preconceitos, mas tem vergonha do namorado cabeleireiro e latino. Paga de comportado, mas tem uma calça de couro com a bunda exposta no armário (ou se acha liberado sexualmente a ponto de usar a calça, mas tem medo de tirá-la do cabide; de qualquer maneira, não corresponde). É gay assumido, mas tem medo que pensem que é passiva. Procura o príncipe encantado, mas não sai do Manhunt – nem durante o trabalho.
Unindo os três amigos, está o elo da pouca consideração que têm por seus parceiros. Agustín acha que o namorado está tão na mão que não há porque não fazê-lo transar com um michê em um “projeto artístico”. Dom não consegue conceber que o coroa não esteja desesperado para tê-lo na cama e que seja capaz de conseguir um companheiro sem usar dinheiro de alguma forma. E Patrick vê em Richie nada além de um mexicano sarado que tem que dar graças a deus por ter alguém como ele de namorado. Levar um fora do mexicaninho? Inimaginável.
É difícil ter simpatia por qualquer dos três protagonistas de Looking, e essa ausência de heroísmo é um dos maiores triunfos do seriado. É uma história que apresenta personagens tridimensionais e cheios de fraquezas. Ao mesmo tempo, deixa claro que eles não enxergam além da fachada uns dos outros. Acho difícil que algum fã da série não tenha se identificado com várias facetas do trio principal – principalmente as menos “limpinhas”, principalmente as que apresentam seus defeitos profundos. Defeitos recorrentes na nossa cultura.
É um retrato do gay contemporâneo? Sim. É o retrato magnânimo que muitos esperavam? Não.
Certamente vou ter interesse em assistir a segunda temporada. Apenas deixo uma súplica aos criadores: por favor não nos submetam a mais meia temporada arrastada. De Manoel Carlos já nos basta o nosso.
Prefiro queer as folk, Brian A. Kinney
[…] você achava o personagem Kevin, da série Looking, um cuzão, agora você pode ter motivos para pensar se o mesmo não se aplica também ao ator que […]
O Patrick é o tipo de cara que eu namoraria.
Gay do mundo real? Podem ser maioria, mas quem tem caráter também é do mundo real…
Vou aderir e assistir essa segunda temporada. Grande abraço.
Triste que isso aconteça. Essa história tá mal contada. Meu único problema com Bryan Singer é ele ter estragado a série X Men. Ele mesmo já admitiu que não é fã de quadrinhos.
Postei no lugar errado. LOL.
Recorte. Assistir a essa série (assim como qualquer outra) sem ter essa palavra em mente pode levar a análises que nem nós mesmo conseguimos entender.
Todos os personagens de Looking são recortes de uma realidade que é muito mais ampla. Não acredito que de inicio houve uma necessidade de derrubar ou solidificar estigmas, levantar bandeiras ou qualquer outra pretensão. O que houve foi a apresentação de três personagens e parte da sua personalidade vivendo em uma cidade que respira o universo gay e a forma como eles absorvem esse universo e talvez por isso a lentidão na narrativa.
O episódio do aniversário do Dom no parque é o evento catalisador da narrativa, que junta todas a pontas soltas dos personagens e é o que se aproxima de uma realidade mais universal onde ficam expostos os preconceitos e os medos e as vontades que levam as crises finais dos personagens.
A crise do Patrick ao levar um fora do papichulo é pelo fato de ele ter ficado com o Richie como segunda opção quando na verdade ele queria levar a vida que o chefe levava e não o chefe em si. Quando ele consegue transar com o Kevin acaba levando um pé de alguém que ele já estava ficando envolvido e que havia decido aceitar após descobrir que a mãe também estava fora dos padrões de normalidade que ele havia sido criado. Essa narrativa é muito rica e se o Patrick não fosse apresentado como um bocó durante 5 episódios este acontecimento não teria surtido o menor efeito no final da temporada.
Uma série de 8 episódios contar 3 simplesmente arrebatadores já está no lucro.
Concordo, hehehe
Muito interessante sua perspectiva da série. Contudo, eu chamaria a lentidão inicial de construção de personagens e a expressão “o mais parecido com o gay o mundo real” é demasiadamente presunçosa, não acha? Entre tantas forças que cortam, traçam e definem a subjetividade do ser humano, entre os milhares de gays “no armário”, usar tal expressão é mais que prepotente, na verdade, é perigoso.
Meu comentário é que a HBO foi ponderando a temática durante a série. Achei que começou bem chatinha e normal e aos poucos foi ganhando tons mais interessantes. Por mais que a difusão e a batalha contra a homofobia seja grande, a HBO optou por um série gay com classe e sem grandes alardes, sempre visando tratar o assunto com a devida normalidade. Sobre os personagens foram durante todos os oito episódios rasos e em crescimento. Patrick, do meu ponto de vista, ainda está muito cru. Não pela indecisão dele, mas acho que o desenvolvimento parte muito da atuação e isso não foi espetacular. Patrick é nitidamente preso a certos estigmas por mais livre que se sinta, ainda existe um peso na vida dele. Agustin é o mais chato de todos os personagens, a atuação é mediana, mas o papel dele é desenvolvido na média. Ele é aquele gay que diz algo, mas age de forma inversa. É do tipo que cria uma realidade pra acreditar porque sua vida é toda desregulada de uma forma que ele não consegue regular. E isso nada tem a ver com a vida sexual dele, que foi a mais animadinha. Tem a ver com a percepção artística de quem se define artista. Dom merecia muito mais espaço além da sua fixação com frango peri peri e isso daria mais espaço a Doris que é extremamente divertida e realista. Suas falas irônicas são reflexos do pensamento de quem está assistindo. Kevin e Richie serão os motivos claros de divisão entre o público e com esse final de temporada bagunçado será interessante descobrir como o morno Patrick vai lidar com isso. Trepar com o chefe normalmente não dura muito ou namorar Richie seria mais complicado?
Clichês, caricaturas e comparações inevitáveis à parte, só consigo pensar o que Brian Kinney e Jack McFarland diriam do charisma, uniqueness, nerve, and talent dos personagens de Looking, nesses pouco menos de 200 minutos da primeira temporada.
Entao né, toda vez que eu vejo alguém falar do sobre looking e sobre a mudança que teve depois do 4 para o 5 episódio, eu lembro dos executivos da HBO que tentaram desesperadamente salvar a série, roteiristas tendo de mudar tudo de uma hora pra outra, depois que o publico gay nos USA flopou totalmente a série por lá! Festas gays patrocinadas pela HBO, sites, blogs, revistas gays sendo pagos para publicar novidades sobre a série, que por sinal é bem fraca, é um Sex and the City misturado com Desperate Housewives, no qual o tema sexo e segredos escondidos são o tema central, mas que não deu certo! Que saudades de Queer as Folk!!!!! Brian A. Kinney e a sua trupe fazem falta, abordando assuntos envolvendo muitos tópicos gays que ainda discutimos até hoje! Márcio, apesar de acompanhar o s teus textos e achar o seu ponto de vista interessante, acho que vc deu uma pisada nesta vez ao dizer que os criadores tem um retrato do gay contemporâneo, viajou legal! abraço!
Nunca vi Queer As Folk, mas acho um retrato fiel sim. O gay contemporâneo é chato, é maldoso e é infantil, bem como os personagens da série. Acontece que não acho que o objetivo seja fazer ativismo de nenhum tipo nem propor discussão, é mais um retrato mesmo. Mais ou menos como Girls. O problema desse modelo é que cansa muito rápido (vide Girls)
Gosto da análise crítica da série… Mas torço o nariz quando leio “o gay o mundo real” ou “um retrato do gay contemporâneo”… Quem são esses? O classe média zona sul do rj, o adolescente da favela, os velhinhos da praça, o rapaz do interior??? Achei que todos esses gays fizessem parte do “mundo real” e fossem “contemporâneos”… Parece que somos tão carentes de representatividade na teledramartugia que toda vez que aparece um personagem gay queremos que ele nos represente, a cada um de nós… E felizmente isso é impossível, pois somos indivíduos únicos, diversos… Os personagens são apenas construções que os autores acreditam que possam gerar interesse no público. QaF, Looking ou Félix não podem representar milhões de pessoas… nem devem! Cada um de nós vive sim numa bolha, uns mais outros menos, pq convivemos com pessoas que de alguma forma se assemelham a nós (profissão, classe social, endereço, gostos, interesses, etc…). Mas acho que devemos estar cientes que o mundo é muito mais amplo, e as pessoas muito mais diversas… Enfim, achar que existe “o gay do mundo real” ou “um retrato do gay contemporâneo”, essa “entidade” que resume nós todos é… preconceito! Preconceito é isso: deduzir o todo de uma pessoa a partir de uma única característica, nesse caso, ser gay. E não é contra isso que alguns de nós lutamos? É esse movimento contra o preconceito que vejo em tantas matérias do lado bi que me deixa feliz e orgulhoso… Enfim… Amo o site, mas não podia me calar…
Bem colocado, Fernando! Vamos tentar prestar mais atenção quanto a isso no futuro. Valeu!!
Bom… também assisti aos 8 episódios, e o perfil que tracei de cada personagem é bem diferente… Patrick, pra mim, não tem nenhum problema quanto sua sexualidade, mas se preocupa demais no que os outros irão pensar, e isso o torna um cara cheio de preconceitos: Richie é carinhoso, focado, dedicado… mas “pobre”, sem ambições; Kevin tem perfil dominador, graduado e ocupa posição de liderança… Esse preconceito justifica o único namoro, e a perda de tempo em sites de relacionamento…
Dom, aproveitador? Não senti isso… o vejo apenas como o não-aceitador da própria idade, por isso vive caçando (e sendo caçado por) novinhos. Se acha velho, e pra provar que ainda tem muito gás (e que pode “parar” o tempo), vive no Grindr e em saunas. Lynn, mais velho ainda, aparece justamente pra que Dom perceba que a vida não “termina” aos 40 e que ele pode – e deve – se preocupar com outras coisas.
E Agustín… bem… esse classifico como o egoísta desorientado. Tudo o que ele fez não foi por tesão (ora, ele percebeu e não gostou da “sintonia” entre o namorado e o GP), mas sim pra uma mistura de “estou sempre no comando da situação” e “preciso mostrar ao mundo a que vim”.
Enfim… considero como o gay do mundo real a mistura dos três, e o que nos diferencia é justamente a inclinação pra um lado… E só discordando mais um pouco (rsrs): pra mim, só dois personagens são “sarados”: Kevin (o big boss) e Dom. Os demais são “em forma”, hahahaha!
Ansioso pra próxima temporada!
“Augustin é o mais parecido com o gay do mundo real” – só existe um tipo? dá pra generalizar assim? como seriam as características do hétero do mundo real?
Marcio, querido! Tudo bem?
Viu? Imaginei que você iria gostar da série, assim como eu gostei! Acho que seu texto foi impecável em tudo: em analisar o quão os fofinhos personagens tem seu lado preconceituso, egocêntricos e como cada qual dá a sua contribuição em deixar a sua vida bagunçada e cheia de crise. De fato, todos eles podem ser considerados ordinários dentro de seus achismos e pré-conceitos. E acho que cada gay tem um pouco de Patrick-Dom-Agustín dentro de si – naquele momento que você se fecha a conhecer alguém que talvez não seja do seu nível social/intelectual, quando se tem vergonha de se assumir como é (afeminado, geek, ursinho, etc), de se expor com medo do que seu círculo social irá achar, de se achar o máximo a tal ponto de notar que sua vida é vazia… Enfim, acho que o que fica de lição é que cada um deveria repensar na sua maneira de ser e agir. Tanto heteros, gays, bis… Bora repensar nas nossas atitudes e sermos pessoas melhores! 😉
Lição KKKKKKKKKKK. Tv dando lição de vida. ZZZZZZZZZZZZZZZZZZ
Eu acho que a visão do autor é um pouco pessimista demais. Não concordo nem discordo, não acho bonito nem feio, só acho que se essa análise fosse feita sobre outro viés, poderia trazer questões mais interessantes. Vejo no Patrick, por exemplo, um gay que assume sua homossexualidade para o mundo mas não para si mesmo. Não por hipocrisia, mas por dificuldade mesmo. Assumir para os outros é sempre mais fácil do que assumir a si mesmo. No Dom, vejo uma evolução do personagem, que realmente viveu a vida se baseando no “veado é só sexo, nada mais” e, a partir da sua crise dos 40 (que não é particularidade do mundo gay), tem uma epifania de que o mundo pode ser mais do que uma foda sem sentido. No Agustín vejo um deslumbramento bobo de um artista. Infantilidade dígna de uma criança que está aprendendo o que é andar, que não consegue distinguir obrigação e dever, desejo e necessidade, dentre outras.
Realmente, o mundo gay está longe de ser cor-de-rosa e arco-íris. Mas o mundo todo está longe disso, não é mesmo? 😉
O brasileiro precisa evoluir enquanto cultura. O homem precisa entender que a mulher tem espaço na sociedade, o branco que o negro é capaz, o hétero que o gay tem direitos e o gay que ele mesmo é melhor do que ele se vê.
Essa premissa me deixou curioso. Não é de hoje que se tenta conquistar o público pelas imperfeições. Também não é raro explorar o camaleão (personagem que parece uma coisa, mas depois se revela outra).
Acho que a hipocrisia seduz o escritor contemporâneo, Por não ser algo específico de um meio, mas presente em quase todo segmento da sociedade. É humano, infelizmente. Não é privilégio gay. Um amigo meu foi bem sincero ao dizer que um filme recente o incomodava porque ele se via de alguma forma. Se a Arte tem algum papel talvez seja cutucar verdades incômodas. A tal mentira que faz ver a verdade.
Mas essa afirmação de “gay do mundo real” pode soar problemática, embora a compreenda. O ser humano é diverso demais, absurdamente, mesmo com os elementos comuns. As boas tramas pra mim, são a que mais compreendem essa diversidade.
Gosto muito de sentir a vida como um grande seriado…
“Agustín, vamos admitir, é o mais parecido com o gay o mundo real, e por isso mesmo o mais odiado pelo público.”
Eu não frequento o meio gay. Não tenho amigos próximos que são, nunca tive, nunca namorei outro homem – ainda -, e espanta-me este pessimismo cru, a forma como você mede a todos nós baseando-se em experiências suas, no que você sente, já fez e fizeram contigo.
Pode ser realmente que o seriado represente bem o gay contemporâneo de grandes metrópoles como São Paulo, NY ou San Francisco, mas existem tantas outras cidades no mundo, tantas formas de gays, e o seriado privilegia justo personagens tão caricaturais, no sentido de que já foram vistos em Queer Is Folk e ninguém os suporta mais. A sensação que tenho é de que metade dos gays vivem em função dessa série, órfãos de representatividade, de um modelo a seguir.
Todas as novelas mostram heteros planejando um futuro, namorando, casando bla, bla, bla; e não há tanta menção em relação a manege, ou por que o outro é mexicano e feio, ou sobre traições descaradas. Parece que vivemos somente pro sexo e mais nada, porque 90% da temática de Queer Is Folk e de Looking, ao que parece, reduze-se a isso.
Particularmente, acho um saco.
Oi Robinho!
Pelo contrário. As novelas são, antes de mais nada, calcadas em relacionamentos que não dão certo e na infidelidade. O expediente mais comum na dramaturgia é o triângulo amoroso. As novelas não falam de ménages? Lembra do Cadinho em Avenida Brasil, que terminava com TRÊS mulheres? A última novela que eu acompanhei minimamente, Salve Jorge, tinha um casal principal em que o homem ia e voltava entre duas mulheres o tempo todo. Entre outras tramas amorosas.
Acho que os personagens de Looking são bem diferentes dos de QaF. Bem menos caricaturais. Agora, esperar que um seriado apresente apenas versões felizes dos gays geraria não apenas uma trama hipócrita (os gays passam por muitos conflitos, muitos comuns aos héteros, e muitos particulares da homossexualidade) como também uma trama MONÓTONA. Isso sim seria uma caricatura. Conflito é o motor de qualquer história.
Quanto à maneira que eu meço aos outros… cada um mede o outro pela régua que tem, e não vejo problema nisso. Eu já namorei algumas vezes, já convivi (e convivo) com muitos gays, e tenho uma vida urbana sim. Você vai ter suas experiências boas e ruins. Se você continuar achando que personagens imperfeitos são representações injustas dos gays em particular (e do ser humano em geral) daqui a um tempo, que bom pra você. Eu prefiro admirar a história bem contada e tentar montar a minha própria com mais alegria que cinismo – mas sem apagar o cinismo totalmente, ralei bastante para conquistá-lo.
A série é sobre relacionamentos humanos, assim como foi QaF, Sex and The City e zilhares de outras séries americanas. Logo, elas vão falar das coisas “boas” e das “ruins” (o julgamento disso é pessoal e intransferível) que constituem nossos universos, nossas relações.
Quem se relaciona, lida com o lado bom (e fácil) e o lado ruim (e difícil) da vida.
Não tem outro jeito.
Quando o amigo aí de cima se relacionar, vai entender isso. E vai esquecer os sonhos criados num ideal romântico (seja hetero, seja gay) da vida perfeita.
Afinal, quem senta num bar pra contar pros amigos só as coisas lindas e boas?
A gente precisa dos dramas.