Quando visitou o Brasil em 2013, o papa Francisco fez uma declaração que fez brilhar os olhinhos de muitos católicos LGBT: “Se uma pessoa é gay, busca Deus e tem boa vontade, quem sou eu para julgá-la?”, respondeu a jornalistas. Será que o novo pontífice seria capaz de eliminar milênios de sermões que condenavam LGBT às labaredas infernais (ou, quando mais brandos, ao celibato e a uma vida de solidão) e abriria os caminhos da fé católica para pessoas de todas as sexualidades e identidades de gênero?
Desde então o papa Francisco vem trilhando um caminho quase tão difícil de entender quanto a Santíssima Trindade. Para cada ato que faz com que LGBTs acreditem que ele está mais para Cleycianne (muito devota, mas no fundo ama – e é amada – pelas guei), não demora muito e o gesto é desmentido por alguma outra declaração que segue a tradicional homofobia da Igreja Católica. Nada mais emblemático que os acontecimentos que ocorreram no rastro de sua recente visita aos Estados Unidos e o início, nesse último domingo, do Sínodo da Família:
- 24 de setembro: Francisco passa por Washington, D.C., durante sua visita aos Estados Unidos.
- 30 de setembro: o advogado de Kim Davis, a tabeliã homofóbica que se recusa a casar todos em seu condado porque não quer cumprir a lei e unir casais homossexuais em matrimônio, divulga que Francisco encontrou sua cliente em segredo durante sua passagem pela capital dos EUA. Ele teria dito para ela “aguentar firme”. O Vaticano a princípio não nega nem confirma, mas depois acaba admitindo que sim, o encontro aconteceu.
- 2 de outubro: o Vaticano declara que o encontro com Davis não indica apoio à posição homofóbica da tabeliã. o reverendo Federico Lombardi, porta-voz do Vaticano, divulgou em nota: “O papa francisco encontrou várias dúzias de pessoas que foram convidadas pelo Nunciado para cumprimentá-lo quando ele se preparava para deixar Washington e seguir para Nova York. Ele não entrou em detalhes sobre a situação de Davis e seu encontro com ela não deve ser considerado uma forma de apoio a sua posição em todos os seus aspectos particulares e complexos”.
- 2 de outubro: vem à tona que Francisco também encontrou um ex-pupilo, homossexual, que foi vê-lo junto de seu parceiro de 19 anos. Yoyo Grassi, um amigo de Francisco dos tempos em que ele ainda vivia na Argentina, afirma que o próprio Francisco pediu para que o encontro fosse marcado. Sobre o encontro, Grassi declarou: “obviamente ele é o pastor da igreja e tem que seguir seus ensinamentos, mas, sendo um ser humano, ele compreende todos os tipos de situações, e está aberto a todos os tipos de pessoa, inclusive aqueles com características sexuais diferentes.” O encontro foi filmado e fotografado. Grassi também afirma que provavelmente o encontro entre Davis e Francisco foi uma emboscada.
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3 de outubro: o Vaticano remove de todos seus cargos o padre Krzysztof Charamsa por declarar-se homossexual às vésperas do Sínodo da Família.Charamsa era oficial da Congregação para a Doutrina da Fé, encarregada precisamente de defender a doutrina da Igreja, e também era secretário da Comissão Teológica Internacional do Vaticano e professor de Teologia da Universidade Pontifícia Gregoriana e da Universidade Pontifícia Regina Apostolorum em Roma. Ele havia declarado poucos dias antes ao jornal Il Coriere della Sera, o maior da Itália: “Quero que a Igreja e minha comunidade saibam quem sou: um padre homossexual, feliz e orgulhoso de sua identidade. Estou disposta a pagar as consequências, mas é hora de a Igreja abrir seus olhos para os fieis homossexuais e entender que a solução oferecida, a abstinência total da vida amorosa, é desumana”, disse. Ele continua padre, apesar de ter vindo a público com seu namorado.
- 4 de outubro: na abertura do Sínodo da Família, o papa Francisco afirma que questões como o casamento igualitário não passam de “moda passageira”. “O plano de Deus para a criação é cumprido pela união amorosa entre um homem e uma mulher, regozijando-se em sua jornada compartilhada”, discursou. Ele pediu para que os fieis superassem “todos os tipos de individualismo e legalismo” que escondem um medo de se aceitar o “verdadeiro significado do que é um casal e da sexualidade humana”, ou seja, o foco do sínodo segue sendo a família tradicional.
- 5 de outubro: os advogados de Davis afirmam que o Vaticano está mentindo para tentar esconder o encontro entre o papa e a tabeliã. O advogado Mat Staver declarou: “O encontro foi particular, sem outros membros do público presentes. A agência Reuters noticiou, erroneamente, que Davis estava numa fila de pessoas para cumprimentar o papa na embaixada do Vaticano. Não havia qualquer fila de pessoas antes, perto, ou ao redor de Kim Davis. Se Kim Davis estivesse numa fila de pessoas ou tivesse sido vista por qualquer pessoa além da equipe do Vaticano, não teríamos sido capazes de manter o encontro em segredo. O rosto de Kim é facilmente reconhecível. Quando passamos por aeroportos grandes como os de LaGuardia, Filadélfia e Reagan, as pessoas a reconhecem e lhe oferecem apoio.”
O papa Francisco morde, depois assopra, depois morde de novo. Apesar de, sim, ter iniciado um diálogo inédito com a população LGBT, inexistente com João Paulo II e Bento XXIII, não há muita indicação de que a Igreja Católica tenha a intenção de acolher seus fiéis LGBT como seres humanos completos, não como almas condenadas à danação eterna apenas por terem nascido como são. As ações do pontífice podem ser amistosos, mas não servem para dar consolo real a seus seguidores que fogem dos padrões heteronormativos. Tratar LGBTs com a mesma compaixão dedicada aos criminosos não melhora sua vida terrena – nem, creem eles, sua vida eterna.
Ele é sonso. Muito sonso.
[…] dias depois de o ex-oficial da Congregação para a Doutrina da Fé, Krzysztof Charamsa, ter vindo a público sobre sua homossexualidade e o longo relacionamento que mantém com outro homem, outro ex-funcionário do papa faz […]
É muito triste ainda saber que damos um passo a frente e dois para trás. Mesmo não sendo para acreditar, acabamos acreditando que a Igreja terá um dia um pensamento igualitário em relação a nós LGBT’s. O que o Papa disse quando veio a Brasil, mas de forma diferente é o que todo cristão diz “Amamos o pecador e não o pecado”, eu penso o seguinte, não quero que a igreja me aceite, quero leis que me proteja e ponto final. Foi assim com os negros e espero que seja assim com nós LGBT’s. Negros são respeitados na maioria das vezes, não porque gostam e sim porque existe uma lei que os defende, senão muitos estariam sendo chamados pelo nome de um animal muito conhecido ai pelas ruas. Não preciso do Papa e sim de direitos, pois deveres o governo sabe nos cobrar direitinho.
O nome disso é demagogia… ele não quer iniciar diálogo com os lgbt, ele quer conquistar jovens cis e heteros que atualmente já entendem que a doutrina católica em relação aos lgbt não faz o menor sentido… aí ele posa de progressista para atrair essa juventude e começa a semear o conservadorismo de sempre… a conta gotas mesmo… o Francisco é uma jogada de marketing da igreja, e uma das medidas mais reacionáris (que visa retornar o mundo ao que era antes) e efetivas já construidas por essa instituição.