Essa tendência da internet de arejar as conversas que antes os manda-chuvas tinham em sigilo não para de render interessantíssimas – e deliciosas – polêmicas. Como provavelmente todos já sabem, no final do ano passado os servidores dos estúdios Sony foram hackeados, o que levou ao vazamento de filmes ainda não lançados e a exposição de vários e-mails constrangedores dos executivos do estúdio. Agora os documentos “não-mais-confidenciais” revelaram mais um lado interessante dos bastidores do cinema: por contrato, a versão cinematográfica do Homem-Aranha (que atende por Peter Parker, quando não está salvando Nova York) não pode ser gay, nem negro.
Na última sexta-feira o site Gawker revelou trechos dos contratos entre a Marvel (editora que criou o personagem Homem-Aranha) e os estúdios Sony, em que se definem as características do Aracnídeo em suas adaptações para os filmes. Os documentos estipulam que o Homem-Aranha:
- Deve ser homem
- Não tortura
- Não mata, a não ser em auto-defesa ou para salvar outras pessoas
- Não fala palavrão
- Não fuma tabaco
- Não vende nem distribui drogas ilegais
- Não exagera no álcool
- Não faz sexo antes dos 16 anos, nem faz sexo com ninguém que tenha menos de 16 anos
- Não é homossexual (a não ser que a Marvel já tenha apresentado o personagem como homossexual)
Outro trecho explicita as características da identidade secreta do Homem-Aranha, Peter Parker:
- Seu nome completo é Peter Benjamin Parker
- Ele é caucasiano e heterossexual
- Seus pais tornam-se ausentes durante sua infância
- A partir do momento em que ele perde os pais, ele é criado em Nova York pela tia May e tio Ben
- Ele ganha seus poderes durante o Ensino Médio ou durante a universidade
- Ele ganha seus poderes ao ser mordido por uma aranha
- Ele cria seu primeiro uniforme azul e vermelho
- O uniforme negro é um simbionte, e não é criado por ele
- Ele é criado como um jovem de classe média em Queens, Nova York
- Ele estuda no Ensino Médio em Queens, Nova York, e faz universidade na cidade de Nova York
Antes que venham reclamar que isso não tem nada demais e que o Homem-Aranha é branco e heterossexual, vamos lembrar os fãs que o Homem-Aranha é um personagem fictício, e portanto não é nem tem que ser nada. Se ele já foi clonado e já morreu e voltou, nada impede que coisas mais mundanas como ser negro ou gay aconteçam com Peter Parker em suas adaptações para o cinema.
Um fato interessante é que esse documento foi assinado em setembro de 2011, um mês depois de chegar às bancas uma nova versão do Homem-Aranha. Nela, quem veste o uniforme e escala os arranha-céus de Nova York é um adolescente de ascendência negra e latina, Miles Morales. No desenho animado para TV, o personagem é dublado pelo rapper Donald Glover. No cinema, no entanto, um Homem-Aranha não vai acontecer tão cedo (ontem foi anunciado que o britânico Tom Holland, branco, será o próximo protagonista da franquia). Como manda o contrato.
Stan Lee, o criador do personagem, deu uma entrevista ao site Newsarama em que justifica as cláusulas que vieram a público:
Eu não me importaria, caso Peter Parker originalmente fosse negro, ou latino, ou indiano ou qualquer outra coisa, que ele permanecesse assim. Mas nós originalmente o fizemos branco. Eu não vejo qualquer razão para mudar isso. Há lugar no mundo para super-heróis gays, com certeza, mas, de novo, não vejo por que mudar as propensões sexuais de um personagem depois que elas já foram estabelecidas. Eu não vejo qualquer problema em se criar novos personagens que sejam homossexuais. Não é uma questão de ser contra gays, contra negros ou contra latinos. Personagens latinos deveriam permanecer latinos. O Pantera Negra com certeza não deveria tornar-se suíço. É só que eu não vejo por que mudar o que já foi estabelecido quando é tão fãcil adicionar personagens novos. Dou a maior força para que criem novos personagens como quiserem. Diabos, eu vou criar um eu mesmo.
Vale apontar que a influência de um meio sobre o outro não é novidade, e que um roteiro mais inovador poderia, sim, afetar os quadrinhos. Originalmente, por exemplo, nem o Super-Homem tinha tantos poderes, nem Batman possuía características famosas como o cinto de utilidades, batmóvel etc. Isso tudo foi criado pelos roteiristas das adaptações dos personagens para a TV, que depois migraram para os quadrinhos.
Pena que o Homem-Aranha negro não vai acontecer. Seria bom para renovar o personagem nos longa-metragens. Talvez quem não tem mais muita paciência para os blockbusters inspirados por HQ ganhasse um incentivo para encarar mais um reboot do Aranha.
Eu não vi preconceito do criador do homem aranha.
Eu acho totalmente desnecessário mudar as características do Peter Parker. Daqui a pouco vão querer que o homem aranhã use batom vestido e salto alto.
Cara, não acho nenhum preconceito ou algo negativo… Peter tem sua identidade própria já, e o grande homem aranha tem participação importantíssima nos próximos filmes da Marvel, não teria como mudar ele sem mudar a história e fazer vários ajustes…
Olha, eu concordo com o criador do homem aranha. Não é preconceito, é só para manter a originalidade. Acho que o Peter Parker representa uma parcela excluída dos nerds que de alguma forma superam a “hierarquia” da adolescência.
Seria interessante um novo personagem, com outro nome, outras histórias e outras características, que fosse picado por uma aranha e se também adquirisse os poderes. Não gosto da ideia de mudar as características do Peter Parker.