Como famílias que têm dois pais lidam com o dia das mães?

Dia das mães numa família de dois pais é um problema?

Em uma família em que os dois pais são homens, a questão da “falta de mãe” vem à tona. Confira como pais e filhos em famílias homoafetivas lidam com isso

por Marcio Caparica

O dia das mães não é mais que uma data comercial.  Mas, mesmo não passando de uma criação para aquecer as vendas no mês de maio, o segundo domingo desse mês pode causar desconfortos para um tipo de família em particular: as formadas por dois pais gays. O que fazer quando a escola pede para cada aluno escrever um cartão para sua mãe? O bombardeio de imagens maternas em todas as lojas chega a incomodar?

Toni Reis, que junto de seu marido David é pai de Alysson, Jessica e Felipe (e convidado do Lado Bi da Paternidade), conta que sua família tira a data de letra: “Este ano as crianças resolveram que o Dia das Mães em nossa casa é o Dia dos Pães. Disseram: ‘vocês para nós são mistura de pais com mães: pães‘. Fizeram um pavê de surpresa e escreveram com pedaços de morango a palavra ‘pães’ sobre ele. As professoras todas sabem que os filhos nossos têm dois pais. Cada um trouxe um cartão feito na escola, para cada pai. Na verdade, acabamos celebrando o Dia dos Pais duas vezes por ano, uma vez no Dia das Mães e outra no Dia dos Pais.”

Já Denis Zamignani, pai de Adriano e Mauro e marido de Roberto Banaco (convidados do Lado Bi da Adoção) diz que em sua casa o Dia das Mães simplesmente não acontece. “A gente não comemora, não tem nada de especial. Quando é possível eu levo meus filhos para visitar a avó, mas esse ano a gente não conseguiu sequer fazer isso. Mas daí, quando chega o Dia dos Pais, a gente comemora em dobro, saímos todos para comer em algum lugar gostoso, celebramos o dia inteiro.”

Confira abaixo como outras famílias formadas por dois pais lidam com o dia das mães, da matéria de Jason Howes para o site Gays With Kids.

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O dia das mães é uma data que mais que levantar a questão “cadê a mãe das crianças”, a esfrega na cara de todos. Ele começou recatadamente em 1908, mas já na década de 1920 havia se transformado nessa bacanal regada a café da manhã com rosas que conhecemos hoje, a ponto de mesmo seu criador começar a fazer campanhas para que ele fosse eliminado.

Não funcionou. Ano passado mais de 20 milhões de dólares foram gastos nos Estados Unidos em presentes para a mãe, o que, apesar de ser pouco quando comparado aos 700 milhões gastos nos feriados de final de ano, ainda assim é a terceira data em termos de gastos dos consumidores.

Isso tudo pode fazer com que os filhos de famílias com dois pais sintam-se meio excluídos, razão por que a pesquisadora e psicóloga Dr. Peggy Drexler recomenda que não se aguarde até o segundo domingo de maio para se ter essa conversa vital com seus filhos. “Essa é uma conversa simples, mas importante, que deve acontecer quando os pais sentem que é a hora certa, não porque a data está chegando”, afirma Drexler, que escreve extensivamente sobre gênero e paternidade. “Isso posto, se o Dia das Mães é a razão por que um pai sente que tem que conversar sobre a estrutura familiar com seu filho, a melhor maneira de fazê-lo é de forma direta e honesta, que deixe claro que sua família é uma em que dois pais ou duas mães escolheram amar-se e ter filhos juntos. Essa é uma afirmação factual, e não há por que ficar justificando.”

Quando tornam-se pais, a maioria dos gays já teve tempo o suficiente para refletir sobre os vários desafios que eles e seus filhos terão que encarar, inclusive como as pessoas que não fazem parte da família podem ver a falta de uma mãe.

Como famílias que têm dois pais lidam com o dia das mães?

Chuck e Matt Casey com sua filha, Addison

Matt e Chuck Casey, ambos com 40 anos, adotaram sua filha Addison quando ela tinha 4 dias de idade e pesava 2,5 quilos. “Nós tivemos que refletir sobre como lidar com as expectativas e ideias dos outros, e quais seriam nossas respostas”, lembra Matt. “Nós vamos direto ao ponto, e mantemos que Addison tem dois pais. Nada de mãe. Felizmente isso ainda não foi um problema para nós, mas não pensamos que isso se deve à nossa postura de não fazer drama a respeito disso.”

Ele admite que as perguntas e silêncios desconfortáveis eram mais comuns antes da família se mudar para Los Angeles. “Nós morávamos no centro-oeste quando adotamos nossa filha. Oito anos atrás nossa família era uma anomalia muito maior”, continua. “Nós já recebemos todo tipo de réplica depois de dizermos que Addison não tem mãe. Na maior parte das vezes simplesmente dizem ‘Ah…’, seguida de uma pausa enquanto a pessoa pensa no que dizer depois. Acho que a opinião da sociedade evoluiu bastante sobre esse tópico. O título de mãe e pai é algo conquistado; não tem nada a ver com a biologia. Quando todos começarmos a pensar assim, essa questão vai se tornar, a meu ver, muito menos relevante e importante.”

Como famílias com dois pais lidam com o dia das mães?

Bill e Brian Orlando-Reno e seus filhos Noah, Dominic e Christian

Bill Orlando-Reno, 39, e seu marido Brian, 33, trocaram recentemente os invernos de Rhode Island pela ensolarada Florida com os filhos Christian, 8, Dominic, 7, e Noah, 6, três irmãos biológicos adotados. Eles tiveram que lidar com a questão da “falta de mãe” nos dois lugares. “Nós somos muito claros e sinceros, dizemos para eles que não há mãe, eles têm dois pais. Os garotos sentem-se muito confortáveis em dizer a mesma coisa. Nós sempre achamos que evitar o assunto ou inventar desculpas desajeitadas só faria criar um mistério ao redor disso tudo. É melhor ser honesto. Nós queremos que qualquer pessoa que pergunte onde é que está a mãe fique sabendo que agora eles conhecem uma família com dois pais, e a encontrou bem no meio do supermercado!”

Apesar das perguntas feitas no cotidiano serem fáceis de lidar, o Dia das Mães, com atividades na escola que têm o potencial de excluir os filhos de famílias com dois pais, muitas vezes requer uma atitude mais criativa e cautelosa.

A dra. Drexler recomenda que se contacte a escola da criança com antecedência. “Pode ser útil entrar em contato com o professor ou professora e informar sobre sua família”, ela avisa. “Enfatize que nem todas as famílias são iguais e que a escola tem que estar ciente disso, e se ajustar a todas as crianças que educa.”

“Nós somos meio superprotetores com ela na escola, e, sendo sincero, em todas as atividades em grupo”, admite Casey. “Não só durante o Dia das Mães, mas também quando prospectamos escolas, aulas e professores. Nós fazemos tudo que podemos para garantir que nossa filha estará num ambiente acolhedor que apoia todos os tipos de famílias.”

Bill e Brian Orlando-Reno comemoram que ainda não encontraram problema algum. “A maioria dos professores com que lidamos até agora têm a mente bastante aberta e adoram a maneira como cuidamos bem dos garotos”, afirma Brian. “Eles podem ver, pelo bom comportamento que eles têm na sala de aula, e pela maneira carinhosa como eles falam de seus pais, que eles são bem cuidados e amados tanto quanto uma mãe cuidaria e amaria. Nós tivemos experiências ótimas até agora.”

A dra. Drexler também acredita que usar essa data tradicional para celebrar a família não-tradicional da criança também ajuda. “Se, digamos, a escola pede que as crianças façam cartões para suas mães porque o Dia das Mães está chegando, sugira que seu filho faça um cartão para uma mulher importante em sua vida – quem sabe uma tia ou uma avó ou uma amiga da família”, ela explica. “Ou ele pode fazer um cartão de dia das mães para seu pai. A família dele não é tradicional, e portanto a maneira como ele comemora essa data também não precisa ser tradicional.”

Para a família Orlando-Reno, esse é um dia para homenagear a mãe biológica de seus filhos, que morreu vários meses depois da adoção de Noah, e homenagear também outras mulheres em suas vidas – e comemorar o aniversário do pai. “Bill nasceu no Dia das Mães, então nós sempre comemoramos seu aniversário ao invés de celebrar o Dia das Mães. Por outro lado, esses garotos têm tantas mães maravilhosas que lhes dão apoio em suas vidas: avós, bisavós e tias. Então nós fazemos questão que eles digam Feliz Dia das Mães para as mulheres incríveis em suas vidas.”

Casey tem uma atitude semelhante. “Nós incentivamos que nossa filha faça algo para uma de suas mães preferidas”, ele conta. “Na maioria dos anos ela faz algo para as avós. Um ano ela fez algo para sua madrinha. Nós minimizamos a questão da falta de mãe e, mais uma vez, enfatizamos que há diferentes tipos de família. A resposta dela a isso tem sido boa.”

Como famílias com dois pais lidam com o dia das mães?

Allen Artcliff e Robbie Cronrod com seu filho Dylan

Esse será o primeiro Dia das Mães  que Robbie Cronrod e Allen Artcliff passam com seu filho Dylan, que nasceu com o auxílio de uma barriga de aluguel há nove meses. Para eles, o Dia das Mães para sempre será uma oportunidade de lembrar da mulher que gestou seu filho, Andrea, e a mulher que doou seu óvulo, Maya.

“Ele ainda é novo demais para compreender isso tudo, mas nós esperamos que essa atitude torne isso mais fácil para todos nós”, diz Cronrod. “Maya encontra Dylan regularmente, e agora ela mesma tem uma filha que é dois meses mais nova que Dylan. Nosso objetivo é que as crianças cresçam sabendo uma da outra e que saibam que são meios-irmãos. Ela sempre será a mãe biológica do Dylan.”

Não chega a surpreender que as questões mais espinhosas a respeito das famílias não-tradicionais parecem preocupar mais os pais que os filhos.

“Cada criança é diferente, mas é bastante impressionante como a garotada não parece se importar sobre o que é ‘normal’ como fazem os adultos”, aponta Casey. “Eu não me lembro de alguma vez em especial em que essa questão tenha surgido, porque nunca tratamos o fato de nossa família ser diferente como um problema. Nós sempre fomos muito diretos a respeito da família de nossa filha quando falamos com ela e com outros. Nossa resposta sempre foi: você tem dois pais em sua família… Todas as famílias são diferentes: algumas têm duas mães, algumas têm um pai, algumas têm uma mãe, algumas têm avós.”

Como prova ele lembra de uma conversa que ele escutou entre Addison e uma outra garota numa festa, recentemente. “Foi mais ou menos assim. Garota nova: ‘Cadê sua mãe?’. Addison: ‘Eu não tenho mãe, eu tenho dois pais.’ Garota nova: ‘Ah, ok. Eu amo meu pai. Deve ser legal ter dois.’ Mais um exemplo de como as crianças não se enroscam com normalidade e constrangimento.”

Isso também funciona para Bill e Brian Orlando-Reno. “É natural para eles, quando eles escutam alguém comentar sobre o Dia das Mães, eles têm uma resposta simples e direta. ‘Nós temos dois pais.’ Simples assim. Eles não sentem que estão perdendo algo. Na verdade, eles sempre acham que têm a sorte de ter dois pais ao invés de um só, e nós temos a sorte de tê-los!”

A dra. Drexler resume tudo em uma palavra. “Não há verdade maior que dizer para os pais em famílias não-tradicionais: ‘Relaxa!'”, ri Drexler. “Se você ama seu filho, o apoia, lhe dá ouvidos, seu filho vai crescer bem apesar dos desafios que venham a enfrentar na escola. Coisas muito boas vêm de fora das nossas expectativas desgastadas. Eu diria o seguinte para todos aqueles que acreditam que podem limitar o conceito de família: a família não é uma questão de quem a compõe, é uma questão da força de seu amor.”

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2 comentários

RAQUEL TRINDADE

Muito obrigada pela matéria. Sou professora, tenho um aluno de uma família homoafetiva masculina e estava apreensiva sobre como iria tratar o dia das mães com a turma e principalmente com o aluno, de forma que não o deixasse constrangido. Imaginava que deveria fazer o que foi proposto, mas não sabia se seria o certo. Tenho muito carinho pelos meus alunos e respeito demais os pais de cada um deles.

jordana

não tenho palavras,mas posso dizer que eu vim de uma família de pai e mãe sem noção então eu acredito que AMOR,CARINHO e EDUCAÇÃO caminham juntos e isto basta e impor isto com muito respeito ótimas pessoas de caráter teremos .
muita sorte,paz,felicidades e que DEUS abençoe todos vocês.

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