“Looking”: urso vai enquadrar Agustin

Frankie J. Alvarez, ator que interpreta Agustin, comenta sobre o desprezo que os fãs da série sentem por seu personagem

por Marcio Caparica

Traduzido da entrevista de Jeremy Kinser para o site Queerty

Frankie J. Alvarez sabe que você não gosta do Agustin, o personagem que ele interpreta em Looking, a comédia dramática do canal HBO sobre um trio de amigos que moram em San Francisco (Jonathan Groff, Murray Bartlett e Alvarez). Os telespectadores concentram toda sua atenção positiva no triângulo amoroso entre Patrick (Groff), Kevin (Russel Tovey) e Richie (Raúl Castillo), e reservam seu desprezo para o personagem de Alvarez, um artista em dificuldades com tendência a fazer coisas erradas. Alvarez compreende porque. Durante a primeira temporada, Agustin enganou seu namorado Frank para que ele fizesse sexo com um michê, acusou Patrick de namorar Richie por caridade e, em geral, deixou todos a seu redor bem infelizes. Testemunhar Frank dar um pé na bunda de Agustin no final da primeira temporada foi uma experiência quase catártica. Mas há mudanças no rumo de Agustin. A segunda temporada (que estreia na HBO dos EUA dia 11 de janeiro) apresentará um novo e inesperado interesse romântico – um urso chamado Eddie (interpretado por Daniel Franzese, do filme Garotas Malvadas) – que vai colocar rédeas em seus comportamentos mais anômalos. Alvarez conversou sobre por que os telespectadores se sentem desafiados por seu personagem, como é fazer compras em sex shops com os outros astros do seriado e como a série vai abordar a prevenção do HIV.

Quando eu assisto Looking, eu me sinto com quando eu assistia Sex and the City 15 anos atrás e me perguntava se os roteiristas tinham alguma escuta lá em casa.

Nós já passamos por momentos – eu, Murray e Jonathan – em que líamos o roteiro e pensávamos “Deus do céu! Isso aconteceu com a gente. Nós já tivemos essa conversa!”. Há uma cena no terceiro episódio em que Agustin e Patrick saem para comprar um enema. Nós passamos por uma situação parecida: uma vez Jonathan me pediu para ir com ele numa sex shop para comprar um certo produto, e nós tivemos uma conversa semelhante e passamos mais ou menos pela mesma coisa, foi surreal. Eu fico feliz por você ter dito isso. Esse é o objetivo do programa – ser o mais real possível.

No final da primeira temporada, Frank dá um pé na bunda de Agustin – bem merecido, diriam alguns – depois de jogar na cara dele que não sabia quem ele era de verdade. Você concorda com essa avaliação de seu personagem?

Acho que é a verdade, e o que Frank disse ecoa no fundo da alma de Agustin. Do começo da segunda temporada até o último quadro aquela conversa é realmente debilitante. Quando nós retomamos a história de Agustin, 6 ou 8 semanas se passaram desde que essa conversa aconteceu e eles continua tão sem rumo quanto no momento em que nós o deixamos. Ele está bebendo muito, usando drogas em excesso, e continua desempregado. Para sua sorte, Patrick o aceitou de volta em sua casa. Eles vão passar um fim de semana no campo em parte para tentar limpar a barra dele. Eles vão precisar fazer muito mais do que isso durante toda a temporada. Na primeira temporada a noção que ele tem de si mesmo está amarrada a sua arte, então quando isso é arrancado dele – merecidamente – não lhe resta nada. Não há lugar melhor para recomeçar e reconstruir, e por meio de seu novo emprego e sua amizade/romance com Eddie ele começa a se abrir. Quem sabe as pessoas vão enxergar que este é o cara que fez faculdade com o Patrick quando eles se tornaram amigos. Você vai conhecer um outro lado dele, e, espero, vai ter uma grata surpresa.

Você mencionou como Agustin usa drogas. Eu reparei que até o momento ele já foi encontrado chapado na calçada duas vezes.

[Risos] Acho que, obviamente, as drogas são uma ferramenta para causar esquecimento. A pressão de ter decepcionado seu namorado e magoado seus amigos e a trilha de coisas quebradas que ele deixa em seu rastro o destruíram, e ele não sabe muito bem como lidar com suas emoções. Há toda uma valentia que tenta disfarçar muito medo. As drogas são uma maneira ótima de esquecer. Ele começa a se recobrar disso, e o personagem de Daniel, Eddie, é muito divertido. A química entre nós realmente fica aparente, os roteiristas ficaram muito felizes com isso, e acabaram escrevendo mais material para nós. Foi divertido esbarrar nisso, e todas essas coisas tiveram um efeito positivo sobre Agustin.

frankEle fez algumas coisas desprezíveis durante a primeira temporada. Por que ele tem essa tendência a ser tão escroto?

Como ator, eu tento não julgar quem ele é. Eu só me pergunto o que é que ele quer e como ele faz para conseguir. Alguém como ele faz escolhas bastante destemidas, mas elas nem sempre são bem pensadas. Elas não são feitas por maldade. Ele não fica retorcendo seu bigode e pensando “Eu mal posso esperar para magoar meu namorado e ferrar meus amigos”. Acho que ele fere os sentimentos deles e só então percebe as repercussões de suas ações. Essa é a coisa mais importante da segunda temporada. Ele começa a perceber como suas ações podem se tornar destrutivas para seus relacionamentos. Ele está fazendo um esforço sincero para se tornar um amigo melhor e se tornar melhor em seu relacionamento, algumas vezes com bons resultados, outras vezes nem tanto. É um processo de aprendizado pelo qual ele está passando ao longo da segunda temporada.

Muitos telespectadores acham que Agustin é muito antipático, mas eu o vejo como alguém que realiza seus piores impulsos, algo que as pessoas fazem na vida real, mesmo quando não querem admitir.

Eu já fui a eventos com o pessoal do programa e muitas pessoas chegam na gente e dizem que adoram o seriado, e várias delas, quando conversam com o Raúl ou o Jonathan, dizem “Meu Deus, eu sou igualzinho a você”. Ninguém diz “Eu sou igualzinho ao Agustin”. Muitas dessas pessoas dizem “Eu tenho um amigo que é igualzinho ao Agustin”. Não me surpreenderia se alguns estivessem inventando um amigo, e na verdade estivessem falando sobre si mesmos. É difícil quando você se enxerga num personagem como esse, mas acho que isso é o que é tão bonito nele. Ele existe. Eu o encontrei dançando no Castro. Acho excelente que ele esteja provocando reações fortes. Ele é um cara de verdade. Ele é um daqueles amigos que sempre estão passando por algum tipo de dificuldade, mas há coisas positivas nele. Você precisa dele para ser você de verdade.

Você interpreta esse personagem exatamente como é escrito, ou você conseguiu incorporar algumas de suas próprias características?

Na segunda temporada eu trouxe mais de mim mesmo para o personagem. Eu sou um cara brincalhão e arteiro, e acho que seu relacionamento com o Eddie trouxe um pouco disso à tona em Agustin. Acho que isso faz bem para ele e aumenta sua personalidade. Sem dúvida, sendo um ator, eu me identifico com seus medos e com sua vontade de ser bem sucedido. Eu encontrei maneiras mais saudáveis de lidar com isso que Agustin, mas definitivamente o medo pode paralizar ou motivar, e nesse momento ele se encontra numa encruzilhada. Acho que o público vai gostar de ver o caminho que ele escolhe.

Daniel Franzese (Eddie) e Frankie J. Alvarez (Agustin)

Daniel Franzese (Eddie) e Frankie J. Alvarez (Agustin)

Nos episódios da segunda temporada que eu assisti Agustin se envolve com alguém que talvez os telespectadores considerem surpreendente. Esse relacionamento se desenvolve durante o resto da temporada?

Sim. O Eddie é um amigo por um tempo, e então isso se transforma num romance. Eu não vou entrar muito em detalhes. É um relacionamento desafiador e empolgante. Eles têm um sistema ótimo para lidarem um com o outro. Acho que Agustin diz umas verdades para o Eddie, e sem dúvida Eddie coloca o Agustin em seu devido lugar quando necessário. No ano passado Frank tinha uma tendência a apoiar Agustin até chegar ao limite, mas Eddie é mais sincero e franco, diz o que tem que ser dito mesmo que seja difícil, e isso faz bem para seu relacionamento a longo prazo. É muito lindo. Eu fico feliz que a comunidade dos ursos vai poder se enxergar num personagem como o Eddie. Foi triste conversar com o Danny [Daniel Franzese] sobre isso. Ele me disse que foi a primeira vez que ele deu um beijo em cena. Eu fico feliz que nosso programa esteja nessa vanguarda, que nós não sejamos tão obcecados com aquele visual empacotado de estrela de cinema. Tentamos escalar pessoas reais e contar histórias reais. Tentamos ser sinceros com as nuances e a variedade de situações que existem dentro da comunidade gay. Há tantas peças diferentes nela que nós não conseguimos contar a história inteira, mas nós estamos fazendo todo o possível.

Você conhecia os ursos antes de fazer o seriado?

Eu conhecia. Minha mãe era bailarina quando era criança, e eu dancei um pouco. Foi por intermédio dessa comunidade que eu conheci uma porção de homens e mulheres gays. Mas no que se refere a essa categorização, isso foi novidade. Eu aprendi a diferença entre um cub e um seal cub. Não faz parte do nosso vocabulário cotidiano, então foi divertido navegá-lo e aprendê-lo. Minha mulher achou o máximo. Ela disse “Ah, então você é uma lontra!”. [Risos.]

Na última temporada Agustin e Richie eram quase inimigos, mas isso parece que vai mudar na segunda temporada. Como a relação entre eles vai evoluir?

Há uma cena muito legal entre eles que está por vir, mas eu não quero revelar muita coisa. É uma cena linda. O Raúl é um ator de eloquência e graça tremendas. Ele é tão sincero, e já vem atuando há muito tempo. Eu me formei na escola de arte dramática faz alguns anos, então de certa maneira ele é um irmão mais velho para mim. Eu aprendo com ele todos os dias, especialmente com as cenas entre ele e Jonathan. Os dois são profissionais no auge de seus talentos. Eles são incríveis. Finalmente ter a oportunidade de interpretar uma cena apenas com ele foi uma dádiva. Com certeza foi um dos pontos altos da segunda temporada.

A amizade entre os personagens que você e Jonathan e Murray interpretam parece muito autêntica e natural na tela. Como vocês conseguiram isso?

Isso se deve a nossa amizade real fora das câmeras. Quando nós fizemos os testes em fevereiro de 2013 a produção experimentou várias combinações de atores, e quando nós três fizemos uma leitura juntos eu me lembro de ter comentado “essa é a equipe dos sonhos”. Nós rimos, mas no fim das contas escalaram nós três. Nos sentíamos à vontade uns com os outros. Tudo parte do Jonathan, da maneira como ele nos guia. Ele é muito aberto e generoso. Não há divas na turma. Todos tomam conta uns dos outros e nós deixamos que cada um brilhe no momento em que ele deve brilhar. Sabemos coletivamente, como um conjunto, que essa é a força do seriado. Ninguém está tentando passar a perna no outro para conseguir mais tempo na tela. Nós amamos uns aos outros e amamos esses personagens.

O que vocês fazem juntos quando não estão filmando?

Nós fazemos ioga juntos, nos finais de semana vamos juntos ao cinema e saímos para dançar no Castro. É louco como nós somos bons amigos. Foi uma situação nova voltar para San Francisco para gravar a segunda temporada depois de a primeira temporada ter ido ao ar. Nós éramos minicelebridades. A gente saía para dançar e os caras compravam bebidas para a gente, paqueravam a gente e tiravam selfies com a gente na pista de dança. Foi bem legal. As pessoas realmente nos acolheram e acolheram o seriado. As pessoas têm um orgulho tremendo dele. Sentem que a gente mostra partes de San Francisco que não apareciam na TV antes. Os habitantes de San Francisco têm muito orgulho de sua cidade, e o fato que que eles acham que estamos fazendo um bom trabalho é o atestado definitivo.

LOOKING-360x223Andrew [Haigh, o produtor e diretor do seriado] disse recentemente à Entertainment Weekly que você não era muito bom de canoagem. Como foi filmar no rio Russian?

[Risos.] Pra começar, quando aquela entrevista foi publicada ele me mandou um e-mail pedindo desculpas. Ele disse “Eu falei para eles que o Agustin não era muito bom de canoagem, e soou como se você não gostasse muito de fazer atividades ao ar livre”. Eu fiz birra de brincadeira em retaliação. Nós todos levamos esse tipo de coisa numa boa.

Quando eu li a entrevista eu apenas supus que você é muito urbano.

[Risos.] Bem, sem dúvida é uma escolha para o personagem. O Agustin não gosta muito de coisas ao ar livre. Ele só quer ficar chapado e esquecer seus problemas. Ele está pouco se lixando para tudo aquilo que deixa o Patrick tão feliz, tipo encontrar a árvore mais antiga da área e fazer canoagem.

Sem revelar muito, há um personagem que diz que tem uma “Casa na Virgínia” e outro faz algo que é descrito como “histeria de Aids”. O seriado vai lidar com o debate sobre drogas para prevenção como o Truvada?

Tudo que eu vou dizer é que essa é uma trama importante. Você foi muito atento em perceber isso nos primeiros episódios, porque os roteiristas estão estabelecendo isso para ser usado mais tarde. É tudo o que eu vou dizer. Nós continuamos a estar bem na vanguarda do que é ser gay ou lésbica no mundo moderno de hoje. Obviamente questões como PrEP e Truvada vão surgir repetidas vezes ao longo da temporada.

Você teve que ser filmado fazendo algumas cenas de sexo bastante explícitas. Como é isso para um ator hétero? Eu fico imaginando o quanto disso é coreografado e o quanto disso é expontâneo entre os atores.

Acho que é uma mistura dos dois. Essas cenas são mesmo incrivelmente vulneráveis e técnicas por causa da maneira como são filmadas. Nós tentamos evitar mostrar algumas partes do corpo e ainda assim maximizar o potencial da história, então acaba tudo sendo bastante técnico. Eu ainda não tive que fazer uma cena de sexo com mulheres, então você vai ter que me perguntar de novo na próxima. Quanto a ser uma cena de sexo gay, fica tudo tão técnico que não se fica pensando sobre qualquer atração ou ansiedade que eu poderia sentir sendo hétero.  O Daniel comentou a mesma coisa. Não há tensão romântica entre nós enquanto atores. Nós não ficamos preocupados com o que a outra pessoa vai pensar. Eu tenho minha esposa, e volto para casa para minha esposa e é isso, então a gente consegue tirar do caminho qualquer coisa extra que poderia atrapalhar e simplesmente contar a história da melhor maneira possível, respeitando um ao outro no processo.

Sendo um hétero que interpreta um personagem gay, quais são as perguntas mais cretinas que já lhe fizeram? Você pode inclusive incluir essa que eu acabei de lhe fazer.

Realmente, do ponto de vista jornalístico, é difícil imaginar que eu vou para o trabalho, tiro a roupa e faço uma cena de sexo, algo que é tão íntimo entre duas pessoas. Mas, para nós, a gente encara isso do ponto de vista narrativo. O que Agustin quer nessa cena? Quando você investe nesse tipo de coisa, a ansiedade vai embora. Esse tipo de pergunta sempre surge. Eu acho que isso é engraçado, porque esse é meu primeiro trabalho grande. Eu nunca fiz uma cena de sexo com Carey Mulligan ou algo do tipo, então isso seria todo um outro conjunto de questões. Eu achei meio preocupante fazerem essas perguntas todas durante a primeira temporada, mas então eu me dei conta de que as cenas de sexo são uma parte importante do programa, então é claro que vão me perguntar sobre elas.

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3 comentários

Luis

eu gosto do Agustin, tem muita coisa nele que eu acho bacana. principalmente pelo foda-se mode on dele. Patrick eu nao gost dele, pois tem muita coisa nele que eh o que eu quero me desprender, nao ser.

Maxxie

Nos primeiros episódios, ele era o meu personagem favorito, era jovem, latino, meio hipster, meio desencontrado na vida, me achava parecido com ele de certa forma, mas a forma como ele tratou o querido do Richie mudou tudo. Gostaria de ver nessa segunda temporada um Richie com defeitos, cometendo erros… Se não, ele fica muito endeusado e o Agustin demonizado o que eu acho seria um erro. PS: o que aconteceu com o Podcast de fim de ano?

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