Homem de 190 kg venceu o Mr Gay UK – e depois foi desclassificado

Não são apenas os gays que têm fixação por “corpos perfeitos”. Barrigas negativas, bundas empinadas, tanquinhos depilados, há uma pressão social para que se alcance uma forma física idealizada em todos os gêneros e orientações sexuais. Mas não vamos fingir que, entre gays, exibir um peitoral rasgado quando se tira a camisa é sim um trunfo, valorizado tanto por outros sarados quanto pelos sedentários. Um grupo que luta tanto para que se aceite a diversidade muitas vezes é um dos que menos celebra a diversidade dentro de si, como podemos conferir pela história de Stavros Louca.

Stravros Louca é um gay britânico que mora em Londres. Ele hoje tem 34 anos, e lutou contra o excesso de peso por toda a vida – atualmente Stavros pesa 190 kg.”Eu era hostilizado por causa do meu tamanho”, lembra em relato ao jornal The Guardian. “Diziam que o motivo de eu ser gay é porque sou tão gordo: eu era incapaz de conseguir uma mulher.”

Até hoje ele diz que é constantemente ofendido por causa de seu tamanho, inclusive entre a população gay. “Quando eu visito bares gays, clubes de dança ou lugares de pegação, as pessoas implicam comigo por causa da minha obesidade”, lamenta. Esse tipo de discriminação é a razão por que ele nunca teve um relacionamento com um gay: “quando tive algum relacionamento, foi com homens bissexuais. Eu estou em busca de um relacionamento monogâmico com um gay, esse sempre foi meu sonho.”

Em 2012, ele resolveu fazer algo a respeito e, em busca de amor, decidiu se expor ao mundo e se inscreveu na competição para Mr Gay UK, organizada com o apoio da revista gay britânica Boyz. Quem sabe seu príncipe encantado estaria na plateia? Na noite do concurso ele foi ao bar em que a competição aconteceria em Londres, o  Black Cap Pub, e se inscreveu. “Ninguém acreditava que eu realmente iria em frente com isso”, recorda-se. Mas ele foi, enfrentando todos os padrões estéticos do concurso. O resultado foi totalmente inesperado.

Stavros fugia totalmente do molde dos outros competidores. “Todos os outros candidatos eram musculosos, altos, magros, sensuais”, explica. “Eu pensei que as pessoas iam me vaiar, rir de mim, até me xingar”. Mas, para sua própria surpresa, a plateia lhe deu apoio absoluto durante todas as rodadas eliminatórias da noite. Nos vídeos do evento é possível ver como o carisma e atitude positiva (e até abusada) de Stavros conquistam todos os presentes.

No round final, a competição estava entre Stavros e um outro competidor sarado. Esse estágio exigia que os concorrentes desfilassem de cueca, mas a organização não dispunha de cuecas que servissem num homem de quase 200 kg. “Vieram me dizer que só tinham cuecas tamanho P/M”, relembra. Stavros colocou a cueca fornecida na cabeça e desfilou sem camisa.

A decisão do vencedor cabia à plateia, que se pronunciaria por meio de aplausos. O candidato com tanquinho recebeu palmas, mas o público veio abaixo mesmo quando decidiu demonstrar seu apoio a Stavros. “Parecia que eu estava num estádio de futebol”, ri. “O clima era incrível. Eu mal podia acreditar. Pensei que finalmente havia virado a mesa.”

A alegria durou pouco. Poucos dias depois, a revista Boyz publicou uma reportagem sobre a competição em que declarava que o vencedor não havia sido Stavros, mas sim o segundo colocado musculoso.  O nome de Stavros sequer aparece no artigo, que se refere tangencialmente a ele quando descreve os inscritos: “Os competidores variavam de gostosões sensuais a ninfetos lindos a outros com encantos menos óbvios” [grifo nosso]. Uma foto pequena do verdadeiro vencedor aparece na página, entre outros dois competidores, sem legenda. “Isso significa que eles resolveram que eu não existia”, reclama Stavros. Dois dias depois da publicação da revista, ele recebeu uma ligação dos organizadores do concurso, dizendo que ele havia sido desclassificado porque ele não cabia na cueca que haviam lhe oferecido para o desfile final.

A história de Stavros veio à tona semana passada, quando o jornal The Guardian publicou um minidocumentário relatando a história (assista-o no final desse post). A revolta nas redes sociais foi incendiária. Desde então, a organização do Mr Gay UK pediu desculpas formais a Stavros Louca. Sua explicação para o ocorrido: não havia nenhum representante oficial da organização no evento, e a decisão de substituir o vencedor foi feito no momento pelo gerente do estabelecimento onde ocorreu o evento. Convenientemente, esse gerente não trabalha mais no bar desde 2013. Os atuais responsáveis pela competição só vieram saber do que aconteceu quando viram o documentário, afirmam. O atual Mr Gay UK (e Mr World), Stuart Hatton, se ofereceu para fazer um ensaio fotográfico com Stavros Louca para demonstrar seu apoio.

Esse tipo de atitude, claro, só faz reforçar padrões estreitos do que é “bonito” numa população que já se sente inadequada por conta dos padrões sociais quanto à sexualidade. Não é de se espantar que tantas pessoas peçam desculpas de antemão em aplicativos de pegação por não serem saradas. O que seria de se esperar, quando mesmo atos corajosos como o de Stavros Louca – e sua vitória por aprovação popular – são apagadas? Precisamos incentivar uma cultura que valorize todos os tipos de corpos – e também em que todos possam dizer que gostam de corpos fora do padrão da academia.